quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Poesia. Lord Byron. «Meu soberbo palácio está deserto, dentro dele a tristeza se assentou; bravias plantas pelos muros crescem; uiva meu cão à porta que guardou»

Cortesia de wikipedia

A despedida

«Adeus, adeus! De minha terra as praias
perdem-se ao longe no azular das águas:
geme a brisa da noite, brama a vaga,
solta a gaivota contristadas mágoas.

Do sol que no ocidente vai sumir-se
a luz seguimos que desmaia os céus;
a ele e a ti, ó terra de meu berço
inda a vez derradeira adeus, adeus!

Em breve o rei dos astros novo brilho
ao mundo c’o a manhã virá trazer;
e saudarei o mar e o firmamento,
mas não o solo que me viu nascer.

Meu soberbo palácio está deserto,
dentro dele a tristeza se assentou;
bravias plantas pelos muros crescem;
uiva meu cão à porta que guardou.

Chega, chega-te a mim, meu jovem pagem;
por que choras assim? O que lamentas?
Temes das vagas o rugir medonho?
O rosto à ventania não sustentas?

Enxuga o pranto que te rega as faces;
nosso forte navio corre ligeiro:
apenas meu falcão o mais querido
na apostada carreira irá primeiro.

Sopre o vento sem freio, ruja a vaga,
que nem o vento, nem as ondas temo;
contudo, meu senhor, não vos espante
se dentro d’alma tristemente gemo.

Porque meu pobre pai, e a tão querida
mãe, que deu-me a existência abandonei;
eis meus amigos a não serem eles,
a não ser Deus e vós outros não sei.

Deu-me a bênção meu pai na despedida
resignado na dor susteve o pranto:
mas até quo do novo a pátria volte
a minha triste mão chorará tanto!

Basta, meu jovem pagem, a teus olhos
ficam-lhes bem as lágrimas da dor;
se eu nesse qual tu ainda inocente
também teria lágrimas de amor.

Vem, meu servo fiel, vem a meu lado,
que tens? Por que descora o teu semblante?
Do inimigo francês acaso enfias,
ou do vento que sopra sibilante?

Não sou tão fraco, meu senhor; da morte
não julgues que ante os p'rigos esmorecera;
porém pensando numa ausente esposa
não é muito que o rosto empalideça.

Perto de vossa habitação meus filhos
companheira junto ao lago moram.
O que há de ela coitada responder-lhes,
se pelo pai que está distante choram!

Basta, meu servo, meu fiel mancebo,
ninguém pode estranhar-te essa tristeza;
mas eu que tenho o génio leviano,
rio, vendo dos mares a largueza.

Quem nos suspiros mentirosos fia
na esposa estremecida ou cara amante?
Novo amor limpará aqueles olhos
Que choravam por nós há um instante.

Não julgues que lamento o bem passado,
nem os perigos antever pareça,
a dor que sinto é que não deixe
em terra nada que um só ai mereça.

Solitário eis-me agora neste mundo
sobre o deserto, ilimitado oceano:
tudo se esqueça, que ninguém se lembra
também de mim, amargo desengano!

Talvez meu cão debalde à porta uivasse,
até ser pelo estranho alimentado;
mas se voltar a mão que o sustentara
infiel morderá já deslembrado.

Veloz contigo pelo mar voemos,
minha barca, eis o que a alma só deseja:
nem me importa a que terra me conduzas,
contanto que da pátria ela não seja.

Salve, ondas do mar azul escuro!
e quando vos perder dos olhos meus,
salve, grutas profundas! salve, ó ermos!
Terras da minha pátria, adeus, adeus!»

In Lord Byron, poema “A despedida”
tradução de JRamos Coelho


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