sexta-feira, 14 de abril de 2017

Sancho I. O Filho do Fundador. Maria Violante Branco. «A aliança matrimonial não se concretizou, mas já o mesmo não se pode dizer das investidas expansionistas de Afonso Henriques»

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A Longa Espera pelo Trono. O mundo que viu Sancho nascer e crescer
«(…) Pouco depois de se separarem, Fernando II decidiu fundar Ciudad Rodrigo, no que perece ser uma resposta-desafio às provocadoras investidas do português. Por seu lado, Afonso Henriques perece ter decidido dar a sua réplica ao leonês, ao contratar o casamento de sua filha Mafalda com Afonso II de Aragão, como forma de garantir apoios fora da esfera leonesa-castelhana e ao conjugar essa manobra diplomática com a intensificação do esfoA aliança matrimonial não se concretizou, mas já o mesmo não se pode dizer das investidas expansionistas de Afonso Henriques, que desde então até 1169 não voltará a dar tréguas a nenhum dos seus vizinhos.
rço de conquista em todas as frentes, a sul, a leste e a norte. O contrato de casamento entre a filha de Afonso Henriques e o herdeiro do trono de Aragão foi de facto celebrado, em finais de Janeiro de 1160, em Tui, mas a sua concretização seria frustrada pela morte prematura da infanta.
A luta renovada em todas as fronteiras, parecia, assim, corresponder à necessidade cada vez, mais premente de defrontar um Fernando II progressivamente mais seguro e ameaçador, tal como devia parecer evidente e quem observasse o crescendo das sucessivas agressões que perpetrava contra os interesses de seu sobrinho, Afonso VIII de Castela e dos tutores dele. Com efeito, a decisão de fundar solenemente Ciudad Rodrigo e de restaurar o seu bispado, transformando esse núcleo populacional, que ficava numa região cujo domínio ainda era muito contestado, mas cuja importância estratégica parecia cada vez maior, num autêntico baluarte simbólico, onde se aliariam ao mesmo tempo a fixação populacional de facto e a afirmação da soberania leonesa de direito, afectava de forma negativa vários ar{rios grupos sociais.
Provocou, desde logo, o desconforto e má vontade dos vizinhos de Salamanca, que viam as suas prerrogativas e sua anterior posição ameaçadas pela rivalidade do novo núcleo populacional que agora se fundava, implantado numa posição estratégica muito favorável, por se situar, por um lado, na confluência de duas das estradas mais importantes de penetração para leste e para sul (a Colimbriana e a Dalmatica), e por outro, na perigosa esfera de influência de duas das cidades mais importantes da região, Salamanca e Zamora. Não admira, por isso, que em breve encontremos Afonso Henriques nesses paragens, nem que o encontremos, logo em inícios de Janeiro de 1163, a entrar pela Extremadura adentro e a apossar-se de Salamanca, com o assentimento e colaboração de seus moradores, que entendiam a vantagem desta aliança, numa união de interesses bem típica desta sociedade tão fluida e sempre em permanente autoconstrução e consolidação política.
Se o controle de Salamanca por parte do rei português foi efémero, já o redobro da pressão na Galiza foi mais perene, com as regiões de Límia e Toronho a integrarem de novo o território português, sem que Fernando II, pressionado demais com os problemas com Castela, pudesse reagir de forma eficiente ou atempada. Tradicionalmente, aceita-se que a pressão do lado castelhano teria forçado o leonês a aceitar a paz com Afonso Henriques (Pontevedra/Lerez em 1165), a qual seria ainda reforçada pelo casamento de Fernando II com Urraca Afonso, a filha mais velha de Afonso Henriques, casamento que, de facto, se consumou nesse mesmo ano de 1165. Naturalmente que com esta aliança se esperaria que a rivalidade e hostilidade entre o monarca leonês e o português acalmasse um pouco. Tendo em vista as questões que Fernando II sustentava nas regiões que faziam fronteira, quer com Castela, quer com os árabes, não seria de estranhar que preferisse suspender a guerra com o seu vizinho português e dedicar-se com maior disponibilidade às restantes linhas de guerra que mantinha em paralelo, pelo que um casamento com a filha do rei português deveria parecer um bom contributo para a manutenção de um entendimento harmonioso. Mas a realidade viria a revelar-se bem diferente do que se imaginava em 1165. Já em meados do século XIII, quando terminava a sua crónica sobre a Hispânia, Rodrigo Toledo registava, de forma falsamente surpreendida, que Fernando II, apesar de ser genro de Afonso Henriques, raramente tinha estado em paz com ele. Nunca se tinham dado bem». In Maria João Violante Branco, Sancho I, O Filho do Fundador, Temas e Debates, Livraria Bertrand, 2009, ISBN 978-972-759-978-3.

Cortesia de Bertrand/JDACT