segunda-feira, 17 de abril de 2017

Estado da Questão. Revistas Filosóficas em Portugal. Pedro Calafate. «Na mesma linha de valorização da filosofia escolástica encontramos a revista Filosofia (1954-1961), publicação trimestral editada pelo Centro de Estudos Escolásticos»

Cortesia de wikipedia jdact

«(…) Assume especial relevo o aparecimento, em 1925, da nova série da Brotéria (Fé-Ciências-Letras, posteriormente com o subtítulo Cultura e Informação), e da Revista Portuguesa de Filosofia (1945 até à actualidade). Ambos os títulos reflectem o esforço cultural e filosófico da Companhia de Jesus no panorama português contemporâneo. Nelas se identifica a permanente abertura e discussão das grandes questões do pensamento contemporâneo, à luz da orientação fundamental de cada uma destas publicações: o personalismo cristão. Tanto a Brotéria como a R.P.F. nasceram a partir de um comum projecto pedagógico, sustentado pela concepção Inaciana da filosofia, a primeira como órgão dos jesuítas portugueses, a segunda a partir da actividade docente do Instituto de Filosofia Beato Miguel Carvalho, embrião da futura Faculdade Pontifícia (Braga 1947).
A Brotéria começou por protagonizar a luta de minorias intelectuais católicas, com destaque para Domingos Gomes Santos, João Pereira Gomes e António Banha Andrade, num esforço de valorização da actividade histórico-cultural da Companhia e, por ela, de revisão da imagem da história pátria, enegrecida pela tese da decadência veiculada pelos manifestos pombalinos e, já neste século, por António Sérgio e Hernâni Cidade. Como suporte fundante deste propósito encontrava-se a valorização da metafísica e mais propriamente da designada Segunda Escolástica peninsular, protagonizada pelos Conimbricenses e pelos mestres da Universidade de Évora. Mais tarde, já sob a direcção do padre Manuel Antunes e até ao momento presente (1992), afirmou-se como tribuna de discussão e crítica dos grandes temas do pensamento contemporâneo, à luz do ideário permanente de um humanismo integral e do conceito global e cristão de homem.
As mesmas directrizes assistem à R.P.F., correspondendo, desde a sua fundação em 1945, ao propósito de apreciação dos grandes problemas humanos da vida presente, à luz da metafísica, que aponta ao espírito as razões últimas dos seres em sua essência, finalidades e condicionalismo, anunciando [...] a mensagem pacífica da Neo-Escolástica, ou seja, a escolástica renovada nas suas grandes correntes, tomista, escotista e suareziana [...]. É esta a linha de orientação permanente da R.P.F. a que poderíamos juntar, o propósito de constante e permanente actualização e a valorização do pensamento português como directrizes fundamentais. Está fora dos nossos propósitos a inventariação da longa lista de colaboradores e estudos de relevância para a filosofia em Portugal. Esse trabalho está feito, para os anos de 1945 a 1974, com a publicação do volume de índices dos trinta volumes então publicados, com índice alfabético de autores e índice sistemático. Importa, no entanto, chamar a atenção para os números especiais que constituem marcos dos estudos de filosofia, abarcando, entre outros, a obra de Pedro Hispano, Francisco Sanches, Pedro Fonseca, Leonardo Coimbra, Teixeira Pascoais, Inácio Monteiro, Platão, Santo Agostinho, Séneca, Escoto, Cusa, Teilhard Chardin, Kant, Hegel e Leonardo Coimbra. Não devemos esquecer ainda a publicação das actas do primeiro congresso nacional de Filosofia (1955), as actas do primeiro congresso luso-brasileiro de Filosofia (1982), as actas do colóquio luso-austríaco sobre Ludwig Wittgenstein (1982) e as actas do II colóquio português de fenomenologia.
Na mesma linha de valorização da filosofia escolástica encontramos a revista Filosofia (1954-1961), publicação trimestral editada pelo Centro de Estudos Escolásticos. Nascida em torno de um grupo de alunos da Faculdade de Letras de Lisboa, contou com a direcção de António Banha Andrade e Maria Manuela Saraiva. Foi intenção dos seus fundadores dar continuidade à tradição filosófica interrompida pela reforma pombalina, conservando, por isso, um fundo escolástico, de feição agostiniana e tomista. Nela colaboraram Diamantino Martins, A. Miranda Barbosa, João Ferreira, Júlio Fragata, Alexandre Fradique Morujão e António Banha Andrade.
A década de quarenta foi particularmente fecunda na criação de revistas com relevo no panorama dos nossos estudos filosóficos, pois é nesse período que se dá o aparecimento de títulos como Atlântico (Lisboa e Rio de Janeiro, 1942 e seguintes) dirigida por António Feiro e Lourival Fontes e com colaboração filosófica de Álvaro Ribeiro, Eudoro Sousa, Delfim Santos e Vieira Almeida; Litoral (Lisboa, 1944-1945), dirigida por Carlos Queiroz, com colaboração filosófica de Álvaro Ribeiro, José Marinho, Delfim Santos, Eudoro Sousa, António José Brandão e Augusto Saraiva; Rumo (Lisboa, 1946), dirigida por Mário Albuquerque, com colaboração filosófica de Delfim Santos, Cabral Moncada, António José Brandão, Eudoro Sousa, Afonso Botelho, Délio Nobre Santos e Luis Ribeiro Soares; Cidade Nova (Coimbra, 1947 e seguintes), dirigida por Carlos Amado e com colaboração filosófica de Álvaro Ribeiro, Afonso Botelho, António Dias Magalhães e António José Brandão.
Sublinhe-se finalmente que ainda nos anos quarenta surge o Boletim do Ministério da Justiça (Lisboa, 1947 e seguintes), o qual, nos primeiros anos da sua existência, inclui preciosa colaboração filosófica, com destaque para a filosofia do direito, em estudos de Luis Cabral Moncada, António José Brandão, Carlos Cossio, Giorgio del Vecchio, António Truyol y Serra, Delfim Santos, Luis Legaz y Lacambra, Miguel Reale, António Silva Leal e António Braz Teixeira.  Em 1951 surge a Revista Filosófica, editada em Coimbra até 1959, com direcção de Joaquim Carvalho. O prestígio de Joaquim Carvalho esteve ainda na base da publicação da Miscelânea de Estudos a Joaquim Carvalho (Figueira da Foz, 1959-1963), publicação de incidência estritamente filosófica, notando-se especial incidência na análise da filosofia alemã». In Pedro Calafate, Estado da Questão, Revistas Filosóficas em Portugal, Philosophia 2, Lisboa, 1993.

Cortesia de Philosophica/JDACT