sábado, 26 de novembro de 2016

Seres Mágicos em Portugal. Vanessa Fidalgo. «Os Romanos chamaram-lhe versipélio, os eslavos volkodlák, os saxões werewolf, ou dracopyre, os franceses loup-garou. Na América Central e do Sul é referido como lubiszon ou lubishome…»

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«(…) Valores como a esperança e a justiça são transpostos, analisa o investigador. Mas não só. segundo Mieder, os contos explicitam verdades sobre o ser humano, o que os torna atemporais e independentes de universos culturais específicos. Na maioria das lendas, das fábulas e dos contos estão representados os problemas arquetípicos do ser humano, mas através de uma linguagem poética e simbólica. Assim, podemos identificar-nos para além das fronteiras entre as culturas, conclui o investigador, que tem vindo a observar que o fantástico e o folclore têm sido recuperados precisamente pela necessidade do homem de sentir uma ligação à terra e ao seu passado. É assim que as lendas passam a fazer parte da cultura e da história dos povos, sendo alicerces vitais para a sua identidade, tal como explica o professor e investigador de património oral da universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Alexandre Parafita: a lenda é um relato transmitido por tradição oral de factos ou acontecimentos aos quais o povo atribui um fundo de verdade. Geralmente têm algo que é real e algo que é fruto da imaginação popular. A lenda é, por isso, mais histórica e mais verdadeira do que o conto. Não é por acaso que a lenda raramente começa, tal como o conto, com a fórmula era uma yez, uma fórmula que nos remete, desde logo, para um passado e um lugar longínquos e indefinidos. Por isso, cada comunidade conserva afincadamente as suas lendas, pois o povo, através delas, conta também a sua história.
Finalmente, a pergunta a que ninguém resiste: existem seres fantásticos? É claro que sim! Existem naquele secreto lugar do inconsciente que teima em não abandonar as deliciosas reminiscências dos contos da infância e que faz de nós adultos mais idealistas e com mais recursos. No final desta investigação, quase em jeito de resposta sobre a pertinência do trabalho que estava a desenvolver, deparei com uma notícia surpreendente: a construção de uma estrada a sul de Reiquiavique foi interrompida porque iria destruir um habitat de elfos. O caso está à espera de uma decisão do Supremo Tribunal da Islândia, onde todos os anos dão entrada vários processos pelo mesmo motivo. A estrada passaria por um campo de lava natural que, segundo o grupo Amigos da Lava, iria atravessar um habitat de elfos e uma catedral. A igreja dos elfos é conectada através da energia da luz com outras igrejas, outros lugares, explicava a um jornal Ragnhildur Jónsdóttir, islandês que afirma ver elfos, acrescentando que se uma igreja é destruída..., bom, isso não é uma coisa boa. Ora, em 2007, uma pesquisa concluiu que cerca de 62 por cento dos entrevistados islandeses acreditava na possibilidade de existirem elfos. Perante isto, resta-me esperar que esta colecção de histórias sirva para deleite de todos aqueles que acreditam ou que gostavam de acreditar...

Lobisomens e Corolários
Motivo inspirador de várias crenças, o lobisomem é uma das mais conhecidas personagens mitológicas e protagonista favorito de muitas lendas portuguesas de norte a sul do País. A designação refere-se à transmutação de um ser humano que, por via de uma maldição ou castigo divino, e apenas em determinadas circunstâncias, adquire a forma e a conduta do lobo. Mas esta assustadora figura lendária tem origens muito antigas e alcance quase universal. Os Romanos chamaram-lhe versipélio, os eslavos volkodlák, os saxões werewolf, ou dracopyre, os franceses loup-garou. Na América Central e do Sul é referido como lubiszon ou lubishome, sendo esta uma das áreas geográficas do globo onde este género de lendas está ainda muito viva. De entre as várias superstições e maldições invocadas para justificar a aparição e o fado de um lobisomem, uma das mais populares em Portugal refere-se ao nascimento de setes filhos do mesmo sexo, sendo o sétimo amaldiçoado! São também comuns as lendas sugerindo que o lobisomem tem de percorrer sete cemitérios, passar por sete encruzilhadas, em sete freguesias, para poder retornar à sua forma humana, antes do amanhecer». In Vanessa Fidalgo, Histórias de um Portugal Assombrado, 2012, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2012, ISBN 978-989-626-371-3.

Cortesia de EdosLivros/JDACT