quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Afonso. 4º conde de Ourém. Alexandra Barradas. «Barcelona onde esteve seis semanas não seria uma novidade para ele. O relato assinala o local onde terá ficado instalado: ... na praçaa de Santa Anna, que era a paa[r] donde pousava o Conde ... No actualmente denominado Bairro Gótico, a toponímia regista uma Rua de Santa Ana»

Cortesia de wikipedia e jdact

«(…) Esta viagem pela península itálica que levou o conde de Ourém até Basileia permitiu-lhe contactar com um ambiente completamente diferente daquele que tinha visto na Flandres. Frequentemente, o relato assinala conflitos latentes e situações de insegurança, demonstrativos do ambiente instável que se vivia nalgumas cidades-estado. E esta luta travava-se não só no campo de batalha, mas também nos edifícios públicos de reunião e administração comunal, cuja construção era promovida e paga pelas associações comerciais e/ou artesanais, e nos que o senhor patrocinava, paços, capelas privadas ou outras construções, ricamente decoradas com pinturas e esculturas. Naqueles territórios, no início do século XV, uma cultura mecenática estava em germinação e dava já passos seguros no sentido de uma atitude de valorização e enriquecimento cultural e artístico que foi levada a cabo, a partir do início do século XV, por inúmeros encomendadores privados, naquela zona tão particular da Europa mediterrânica.
Tudo o que ficou assinalado nos textos e que expressamente é referenciado, constitui um conjunto bastante interessante de obras de arquitectura que o conde de Ourém viu: vários paços régios e outros de natureza mais modesta, estaus, castelos e alcáçovas e edifícios de carácter religioso: Catedral de Tarragona, Mosteiro de Montserrat em Barcelona, Catedral e Baptistério de Pisa, Catedral, Torre e Baptistério de Florença, Basílica de S. Petrónio em Bolonha, Catedral de Milão, Mosteiro de São Bernardo nos Alpes e as catedrais de Basileia, Ruão, Estrasburgo, Colónia e Mosteiro de São Francisco e das Onze Mil Virgens, na mesma cidade. Mas, certamente, outros edifícios igualmente importantes e que o texto não assinala, devem ter sido observados. Esta afirmação fundamenta-se no facto de, sendo as estadas do 4º Conde de Ourém por vezes prolongadas e sendo aqueles edifícios marcos significativos nas cidades, decerto foram vistos. Podemos afirmar que em Valencia, Afonso terá, pelo menos, visto a respectiva Catedral, construída entre meados do século XIV e o início do seguinte, que já apresentava o seu campanário, el Miquelete, uma torre octogonal que se erguia a mais de 51m, concluída em 1429.
Barcelona onde esteve seis semanas não seria uma novidade para ele. O relato assinala o local onde terá ficado instalado: ... na praçaa de Santa Anna, que era a paa[r] donde pousava o Conde ... No actualmente denominado Bairro Gótico, a toponímia regista uma Rua de Santa Ana, junto à Praça da Catalunha. Decerto esta é uma designação recente, pelo que se apresenta provável que Afonso tenha pousado num edifício desta praça, que no século XV deveria evocar o nome da mãe de Nossa Senhora. O relato descreve com pormenor os encontros que Afonso teve com a rainha de Castela que estava acompanhada da irmã, no paço onde pousavam. O texto não assinalou o nome pelo qual era conhecido, mas pela importância e posição de quem nele se hospedou só poderia tratar-se do palácio real, localizado próximo da catedral, confirmando assim que Afonso conheceu, com algum detalhe (a passagem do relato do encontro descreve-o demorado) este importante paço de Barcelona e teve oportunidade de admirar novamente a magnífica arquitectura gótica daquela cidade. Relativamente à estada em Florença que ocorreu entre 8 e 21 de Julho, julgamos que se terá revelado muito significativa, não tanto pelas questões relacionadas com a missão diplomática do conde de Ourém mas porque nesta tão importante cidade da Toscânia se vivia um singular momento: no final do mês seguinte ou seja a 30 de Agosto de 1436 seria sagrada a cúpula do Duomo, ainda não rematada pelo lanternim que mais tarde a coroou, em 1461. Por estes tempos, a fama de Brunelleschi deveria ecoar pela cidade e com ela a renovação da arquitectura florentina. Sabemos que o estaleiro da catedral, onde estariam algumas das máquinas concebidas/inventadas por aquele arquitecto e que possibilitaram o fecho da cúpula, passados mais de sessenta anos sobre a conclusão das obras, ainda era ponto de atracção e passagem obrigatória de viajantes curiosos. O que não seria em 1436 a um mês da inauguração da grande obra?» In Alexandra Leal Barradas, D. Afonso, 4º conde de Ourém, Revista Medievalista, director Vasconcelos Sousa, Ano 2, Nº 2, Instituto de Estudos Medievais, FCSH-UNL, FCT, 2006, ISSN 1646-740X.

Cortesia de RMedievalista/JDACT