sábado, 2 de julho de 2016

A Conspiração Colombo. Steve Berry. «Quem é você para ordenar alguma coisa?, respondeu o espião. Você não é um homem de Cristo. Colombo absorveu o insulto com a paciência que uma vida difícil lhe dera…»

jdact e wikipedia

1504. Jamaica
«(…) Ele sabia que esta seria sua última vez no Novo Mundo. Tinha 51 anos e conseguira reunir um número surpreendente de inimigos. Sua experiência no ano anterior era prova de que esta quarta viagem estava amaldiçoada desde o começo. Primeiro, explorara a costa do que passara a acreditar ser um continente, cujo litoral infinito se estendia de norte a sul até onde ele navegou. Após concluir essa patrulha, esperara desembarcar em Cuba ou Hispaniola, mas seus navios corroídos por vermes só conseguiram chegar até à Jamaica, onde ele os ancorou e aguardou um resgate. Que não chegou. O governador de Hispaniola, um inimigo jurado, resolveu abandonar Colombo e seus 113 homens à morte. Mas ela não chegou. Em vez disso, algumas almas corajosas remaram em uma canoa até Hispaniola e trouxeram um navio. Sim, ele realmente tinha muitos inimigos. Eles negaram todos os direitos que Colombo um dia tivera segundo as Capitulações. Ele conseguira manter seu status de nobre e o título de
Almirante do Oceano, mas isso não significava nada. Os colonos de Hispaniola se revoltaram e o forçaram a assinar um acordo humilhante. Há quatro terríveis anos, ele foi levado de volta para a Espanha, acorrentado e ameaçado de ser julgado e preso. Mas o rei e a rainha lhe concederam um inesperado indulto e lhe deram fundos e permissão para a quarta viagem. Ele se questionara sobre a motivação deles. Isabel parecia sincera. Ela tinha uma alma aventureira. Mas o rei era outro assunto. Fernando nunca gostara dele, dizendo abertamente que a viagem a oeste lhe parecia uma estupidez. Claro, isso foi antes de Colombo ser bem-sucedido. Agora, Fernando só queria ouro e prata. Putos. Mentirosos. Todos eles. Acenou para que abaixassem as arcas. Seus três homens ajudaram, pois eram pesadas. Chegámos, gritou ele em espanhol. Seus acompanhantes sabiam o que fazer. Espadas foram empunhadas e os nativos, rapidamente cortados em pedaços. Dois gemeram no chão, mas foram silenciados com floretes enfiados no peito. Essas mortes não significavam nada para Colombo; eles não eram dignos de respirar o mesmo ar que os europeus. Pequenos, de pele marrom, nus como no dia em que nasceram, não possuíam linguagem escrita nem crenças fervorosas. Moravam em aldeias no litoral e, pelo que percebera, apenas cultivavam algumas plantas. Eram liderados por um homem chamado cacique, com quem Colombo fizera amizade durante o ano em que ficara abandonado. Foi o cacique quem lhe ofereceu seis homens ontem, quando ele ancorou para sua jornada final no litoral norte. Uma caminhada simples até as montanhas, dissera ele para o cacique. Só alguns dias. Ele conhecia o suficiente da língua aruaque para fazer o pedido. O cacique demonstrou que tinha entendido e concordou, apontando para seis homens que carregariam as arcas. Ele fizera uma reverência em agradecimento e oferecera vários guizos como presentes. Graças a Deus trouxera muitos. Na Europa, eles eram amarrados às garras de pássaros treinados. Sem valor. Aqui, eram uma moeda valiosa. O cacique aceitou o pagamento e fez uma reverência também. Já negociara com esse líder outras duas vezes. Tinham criado uma amizade. Um acordo do qual ele se beneficiava totalmente. Quando visitaram a ilha pela primeira vez em 1494, fazendo uma paragem de um dia para vedar vazamentos em seu barco e repor o depósito de água, seus homens notaram pequenas partículas de ouro nas águas claras dos rios. Ao questionar o cacique, Colombo ficou sabendo de um lugar em que os grãos de ouro eram ainda maiores, alguns com o tamanho de feijões. O lugar onde ele estava agora. Mas, diferente da monarquia espanhola fraudulenta, o ouro não o interessava.
Seu objectivo era maior. Fixou o olhar em De Torres e seu amigo soube o que viria a seguir. Com a espada na mão, De Torres apontou a lâmina para um dos três espanhóis, um homem baixo e robusto, com cara de urso. De joelhos, ordenou De Torres enquanto tirava a arma do homem. Dois outros homens da tripulação levantaram suas espadas em apoio. O prisioneiro se ajoelhou. Colombo o encarou. Você acha que sou estúpido? Almirante... Ele levantou a mão pedindo silêncio. Quatro anos atrás, eles me levaram de volta para a Espanha, acorrentado, e me tiraram tudo que era meu por direito. Então, de repente, me devolveram tudo. Ele fez uma pausa. Com apenas algumas palavras, o rei e a rainha me perdoaram por tudo que eu supostamente fiz. Eles acham que sou ignorante? Ele hesitou de novo. Acham. E esse é o maior de todos os insultos. Durante anos, implorei que financiassem a minha viagem pelo oceano. Por anos, recusaram. Porém, com apenas uma carta para a coroa, recebi os fundos para esta quarta viagem. Um simples pedido, e tudo foi atendido. Foi quando percebi que alguma coisa estava errada. Espadas continuavam em punho. Não havia para onde o prisioneiro fugir. Você é um espião, disse Colombo. Enviado para reportar o que faço. Olhar para esse tolo o deixava enojado. O homem representava toda a traição e as tristezas pelas quais ele fora forçado a passar nas mãos dos espanhóis mentirosos. Conte-me o que os seus patrões querem saber, mandou Colombo. O homem permaneceu em silêncio. Diga-me. Estou mandando. O tom de voz se elevou. Eu lhe ordeno.
Quem é você para ordenar alguma coisa?, respondeu o espião. Você não é um homem de Cristo. Colombo absorveu o insulto com a paciência que uma vida difícil lhe dera, mas viu que seus compatriotas não eram tão compreensivos. Apontou para eles. Estes homens também não são de Cristo. O prisioneiro cuspiu no chão. Sua missão era reportar tudo que acontecesse na viagem? Essas arcas que estão aqui connosco eram o objectivo deles? Ou eles estão simplesmente atrás de ouro? Você não tem sido leal. Colombo deu uma gargalhada. Eu não tenho sido leal? A Santa Igreja garantirá sua condenação eterna no fogo do inferno. Então, ele percebeu. Esse agente pertencia à Inquisição (maldita). O maior de todos os inimigos. Uma chama de auto-preservação cresceu dentro dele. Percebeu a preocupação nos olhos do amigo De Torres. Sabia desse problema desde que partiram da Espanha, dois anos atrás. Mas havia mais olhos e ouvidos? A Inquisição (maldita) queimara centenas de pessoas. Ele odiava tudo que ela representava. O que ele estava fazendo ali fora planeado exclusivamente para conter esse mal». In Steve Berry, A Conspiração Colombo, 2012, Maria B. Medina, Editora Record, 2014, ISBN 978-850-140-380-3. 

Cortesia de ERecord/JDACT