sexta-feira, 8 de abril de 2016

O Julgamento de Bouro. A Terra e os Homens. Cínésio Romão Silva. «As inquirições Régias Portuguesas constituem, uma fonte inesgotável de informações, documento único que animou o nosso interesse específico pelas terras do Julgado de Bouro»

Cortesia de Cinesioromaosilva e jdact

«Este trabalho tem como base as inquirições realizadas no julgado de Bouro em 1220 e 1258, ao longo do século XIII, nos reinados de Afonso II e Afonso III, respectivamente. Escolhido este território de pequena dimensão, este apresenta-se em dois momentos diferentes, quer em tempo quer em área, em tempo, por tratar-se de dois reinados diferentes, e em área, devido as dimensões do julgado que são sofreram modificações de uma inquirição para a outra. Em 1220, temos um julgado composto por setenta freguesias, situadas entre o Rio Cávado e com fronteiras com os julgados de Nóbrega, Penela, Prado e a serra do Gerês confrontando com o reino de Leão, numa região populosa, onde a fixação se fez privilegiadamente junto aos canais fluviais, um segundo momento, em 1258, este julgado de Bouro passa a ter dezoito freguesias, localizadas entre dois rios, o Cávado e o Homem, que delimitavam uma área bem definida mais a Serra do Gerês que confrontava com o reino de Leão. Estes rios, além de sua importância no fornecimento de alimentos aos habitantes da região, por possuir grandes cardumes e diversas variedades de peixes ao longo de seu leito, serviam também como via de transporte dos diversos tipos de cargas e passageiros que transitavam de um lado para outro, ou ao longo do rio. As inquirições Régias Portuguesas constituem, uma fonte inesgotável de informações, documento único que animou o nosso interesse específico pelas terras do Julgado de Bouro. Com base nas fontes acima citadas e com a finalidade de apresentar a cartografia deste julgado no Portugal Medievo, assim como também uma análise do sistema económico, social e de inter-relação de poderes no seu tempo e espaço, chegámos não ao fim de nossos interesses, mas, à certeza da necessidade de continuidade de um esforço e vontade para a pesquisa e estudo de uma história rica, profunda e científica. Este estudo debruçar-se-á os esforços e acções desenvolvidas por homens devidamente juramentados, com incumbência de registar todas as respostas e informações que fossem citadas, conforme as interrogações dos inquéritos apresentados em duas épocas distintas. Nota-se, no espaço de tempo analisado, uma redução de terras incorporadas no julgado do Bouro. Sendo a inquirição de 1220 ordenada por Afonso II, que após suas confirmações de privilégios e bens entregues pelos seus antecessores a concelhos, nobres e instituições religiosas existentes naquele período, iniciando uma nova forma de saber quais os direitos do rei e da coroa. Ao mesmo tempo esta inquirição efectuada com o objectivo de conhecer qual o património da coroa, apresenta-nos o primeiro levantamento dos bens régios e das apropriações indevidas efectuadas pela nobreza, clero, e até pelos vilãos. Passado um período de transição (só trinta e oito anos depois em 1258, Afonso III, voltou a usar inquirições com o mesmo objectivo da de 1220, reprimindo as usurpações sofrida pelo rei e dos direitos da coroa, há um retorno aos trabalhos das inquirições, estas agora ordenadas por Afonso III, em 1258, o qual, com a sua autoridade real e estando atento aos acontecimentos, promoveu esta acção, com a intenção de reduzir a expansão do regime senhorial, feita na maioria das vezes por formas abusivas, às custas do património régio, das explorações dos pequenos agricultores e proprietários vilãos. Baseado nas informações colhidas por estes inquéritos, conseguiu-se elaborar um cadastro de informações que continha dados sobre: terras foreiras, reguengos, coutos e honras nas diversas freguesias inquiridas por aquela alçada, tomando assim conhecimento dos abusos e das apropriações de direitos régios e da coroa por parte dos senhores. Após este breve apontamento de interesse por uma região, mesmo que pequena, que sofreu tantas modificação na sua estrutura física, social, económica e estrutural, procurámos ver, através da documentação, impulsada à acção régia que visou sustentar e recuperar o património real, usando assim as inquirições como meio prático de acção administrativa, força e poder.
A existência de um número considerável de trabalhos que as utilizam como fonte subsidiária, não invalida o facto de estudos específicos sobre uma região pequena. No entanto sabemos que os trabalhos existentes não são ainda em número suficiente para podermos ter uma cartografia do Portugal Medievo (sob o ponto de vista económico, social e de inter-relações dos poderes na terra), que nos permitam partir para as análises estruturais de vocação macroscópica. Esse desígnio foi possível depois de um aturado e demorado trabalho de micro-história, com estudos de pequenas regiões e julgados, nos quais a informação presente nas inquirições pudesse ser trabalhada de forma sistemática e racionalizante, antes de se passar ao estudo dos fenómenos mais abrangentes ou tendências gerais. Consciente desta lacuna, foi nesse sentido que este projecto se quis inserir.

A Exploração da Terra
A escolha por uma análise regional como base para o trabalho de mestrado ficou a dever-se à curiosidade despertada pela leitura de fontes e textos que divulgaram os estudos da vida dos grupos e das sociedades em suas regiões. A documentação escolhida para esse fim, permitiu-nos seguir uma linha onde pudemos estudar o perfil de ocupação dos homens nas suas terras, em três âmbitos fundamentais: geográfico, económico e social. Determinada a escolha de uma região como universo de estudo, partimos para a primeira tentativa de delimitação geográfica dessa área específica, considerando a sua característica feição nortenha, com os seus rios e montanhas definidos também pela distinção do clima e pela forma estrutural do seu relevo. Escolhemos as terras de Bouro devido ao interesse que elas assumem nas Inquirições do século XIII ordenadas pelos reis Afonso II e Afonso III e às mudanças detectáveis entre uma época e a outra. A nossa escolha voltou-se para o espaço que envolveu essa região do Norte em dois períodos significativos com as Inquirições promovidas pelo rei Afonso II em 1220, com uma dimensão geográfica fronteiriça de área mais alargada e as Inquirições de Afonso III em 1258, com outro território bem definido no que respeita aos seus limites, mas tendo passado, durante esse intervalo, a uma extensão muitíssimo mais reduzida». In Cinésio Romão Silva, O Julgamento de Bouro, A Terra e os Homens, Dissertação de Mestrado em Estudos Medievais, Estudos sobre o poder, Coordenação de Maria João Violante Branco, Universidade Aberta, Lisboa, 2009.

Cortesia da UAberta/JDACT