segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Escritos Políticos. A Arte da Guerra. Maquiavel. «No oferecimento do livro, Maquiavel roga a Lorenzo que o receba como um testemunho da sua submissão, afirmando que o maior presente que podia oferecer ao governante era a lealdade de, em pouco tempo, com a leitura do pequeno volume…»

Cortesia de wikipedia

Maquiavel faz política
«(…) A intenção do autor não era outra senão produzir um manual do que hoje denominamos “marketing político”. Um manual que ajudasse na unificação da Itália, fortalecesse o poder absoluto e o auxiliasse na recuperação dos cargos públicos que ocupara durante a fase republicana da política florentina. Maquiavel, que vivia a angústia e a solidão do exílio, cultivava a vontade decidida de recuperar o seu emprego e sua posição. A melhor ideia que temos do seu dia-a-dia foi fornecida por ele mesmo, numa carta célebre que escreveu ao seu amigo Francesco Vettori, embaixador em Roma e homem ligado aos Médici: … pela manhã, eu acordo com o sol e vou para o bosque apanhar lenha; ali permaneço por duas horas verificando o trabalho do dia anterior e ocupo o meu tempo com os lenhadores, que sempre têm desavenças, seja entre si, seja com os vizinhos [...] Deixando o bosque, vou à fonte e de lá para a caça. Trago um livro comigo, ou Dante, ou Petrarca, ou um destes poetas menores, como Tibulo, Ovídio ou outros: leio as suas paixões, os seus amores e recordo-me dos meus, delicio-me nesse pensamento. Depois, vou à estalagem, na estrada, converso com os que passam, indago sobre as notícias dos seus países, ouço uma porção de coisa e observo a variedade de gostos e de características humanas. Enquanto isso, aproxima-se a hora do almoço e, com os meus, como aquilo que me permite o meu pobre sítio e o meu pequeno património. Finda a refeição, retorno à estalagem [...] lá me entretenho jogando cartas ou [...]
Assim desafogo a malignidade do meu destino [...] Chegando à noite, volto à minha casa e entro no meu gabinete de trabalho. Tiro as minhas roupas cobertas de pó, e visto as minhas vestes dignas das cortes reais e pontifícias. Assim, convenientemente trajado, visito as cortes principescas dos gregos e romanos antigos. Sou afectuosamente recebido por eles e me nutro do único alimento a mim apropriado e para o qual nasci. Não me acanho ao falar-lhes e pergunto das razões de suas acções; e eles, com toda a sua humanidade, me respondem. Então, durante quatro horas não sinto sofrimentos, esqueço todos os desgostos, não me lembro da pobreza, e nem a morte me atemoriza [...] Denominar O Príncipe de obra de marketing político não significa qualquer intenção de releitura da obra ou de reinvenção de Maquiavel. Trata-se apenas de repor o trabalho no seu contexto primitivo, no seu sentido primordial, desde a concepção do roteiro até ao resultado final. Maquiavel usou o livro tentando sensibilizar os Médici para a sua situação. Quando foi escrito, estava destinado a Juliano de Médici. Mas com a sua morte, acabou dirigido a Lorenzo de Médici. Outro trecho da mesma carta a Vettori mostra-nos bem uma ideia do estado de espírito e da disposição do autor:
O que me leva a dedicar o meu opúsculo a Juliano é a necessidade que me aflige, porque me consumo e não posso continuar por muito tempo assim sem que a pobreza faça de mim indivíduo desprezível; e depois, eu gostaria que os Médici me dessem um emprego, mesmo que começassem por me mandar empurrar um rochedo; pois, se mais tarde eu não conseguisse ganhar os seus favores, eu só teria de culpar-me a mim mesmo. Quanto ao meu tratado, se for lido perceber-se-á que os quinze anos que passei aprendendo a arte da política, não os passei nem dormindo nem brincando; e deveria haver grande interesse em se servir de um homem cheio de experiência adquirida à custa de outrem. Não se deveria, além disso, duvidar de minha lealdade, pois, tendo sido sempre fiel aos meus compromissos, não é agora que vou aprender a não cumpri-los; e não é ao fim de quarenta e três anos, esta é a minha idade, de bons e leais serviços que podemos mudar a nossa natureza. Da minha bondade e da minha lealdade, aliás, dá testemunho a minha pobreza actual.
No oferecimento do livro, Maquiavel roga a Lorenzo que o receba como um testemunho da sua submissão, afirmando que o maior presente que podia oferecer ao governante era a lealdade de, em pouco tempo, com a leitura do pequeno volume, compreender aquilo que em tantos anos e com tantos incómodos e perigos vim a conhecer. E conclui com um apelo:… se Vossa Magnificência, das culminâncias em que se encontra, alguma vez volver os olhos para baixo, notará quão imerecidamente suporto um grande e contínuo infortúnio.
Maria Tereza Sadek, no texto Nicolau Maquiavel: o cidadão sem fortuna, o intelectual de virtú assinala que, depois da redacção de O Príncipe, a vida do autor é marcada por uma contínua alternância de esperanças e decepções. Maquiavel busca incessantemente, sem sucesso, durante vários anos, retomar as suas funções públicas. Lorenzo Médici, a quem oferece o livro, pelo que se sabe, jamais sequer irá abri-lo. Somente após a morte de Lorenzo, em 1519, Maquiavel volta a ser ouvido pelos governantes de Florença: o cardeal Júlio Médici pede-lhe sugestões sobre a organização política do Estado. No ano seguinte, a Universidade de Florença encomendou-lhe a história da cidade, nascendo daí as Istorie Fiorentine, obra inacabada e também motivo da sua última frustração política». In Maquiavel, Escritos Políticos, A Arte da Guerra, José Nivaldo Junior (Maquiavel, O Poder, História e Marketing), Colecção a Obra Prima de Cada Autor, Editora Martin Claret, S/R, Wikipedia.

Cortesia deEMClaret/Wikipedia/JDACT