quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Poemas de Amor. Organização de Inês Pedrosa. «Ai flores, ai flores do verde pino, se sabedes novas do meu amigo! Ai Deus, e u é? Ai flores, ai flores do verde ramo, se sabedes novas do meu amado! Ai Deus, e u é?

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Cantiga. Partindo-se
«Senhora, partem tão tristes
meus olhos, por vós, meu bem,
que nunca tão tristes viestes
outros nenhuns por ninguém.

Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tão tristes os tristes,
tão fora de esperar bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém».
Poema de João Roiz Castelo Branco (século XV)


«Desarrezoado amor, dentro em meu peito
tem guerra com a razão, amor que jaz
e já de muitos dias, manda e faz
tudo o que quer, a torto e a direito.

Não espera razões, tudo é despeito,
tudo soberba e força, faz, desfaz,
sem respeito nenhum, e quando em paz
cuidais que sois, então tudo é desfeito.

Doutra parte a razão tempos espia,
espia ocasiões de tarde em tarde,
que ajunta o tempo: enfim vem o seu dia.

Então não tem lugar certo onde aguarde
amor; trata traições, que não confia
nem dos seus. Que farei quando tudo arde?»
Soneto de Sá Miranda (1481-1558)


«Onde porei meus olhos que não veja
a causa, donde nasce meu tormento?
A que parte irei co pensamento
Que para descansar parte me seja?

Já sei como s’engana quem deseja,
em vão amor firme contentamento,
de que, nos gostos seus, que são de vento,
sempre falta seu bem, seu mal sobeja.

Mas inda, sobre claro desengano,
assim me traz est’alma sogigada,
que dele está pendendo o meu desejo;

e vou de dia em dia, de ano em ano,
após um não sei quê, após um nada,
que, quanto mais me chego, menos vejo».
Soneto de Diogo Bernardes (1520-1605)

In Inês Pedrosa (organização), Poemas de Amor, 2000, Antologia de Poesia Portuguesa, Publicações dom Quixote, Lisboa, 2001, 2010, ISBN 978-972-201-944-6.

Cortesia PdQuixote/JDACT