sexta-feira, 10 de julho de 2015

Breve Notícia sobre o Descobrimento da América. Teixeira de Aragão. «Esta ultima parte tinha uma janella em estylo manuelino, distincta pelo seu melhor trabalho artistico, bipartida por uma columna, tendo gravado no capitel, na face esquerda, em uma moldura ms (Jesus), na do centro 1494 e na da direita MARIA»

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NOTA: Conforme o original

A América Antecolombiana
«(…) Em 1494 foi Behaim chamado a Lisboa por João II e encarregado de uma melindrosa missão ao imperador da Allemanba, qual era a de lhe pedir que pela sua grande influencia procurasse destruir as difficuldades, que havia em Portugal para a legitimação de seu filho natural, o príncipe Jorge, sendo a opposição principal a da rainha dona Leonor. N'esta jornada soffreu grandes transtornos, sendo duas vezes aprisionado pelos piratas, e quando conseguiu chegar ao seu destino a feição politica na corte do rei justo havia mudado, e por isso recebeu ordem de sustar as diligencias de que ia encarregado e de regressar ao reino.
A 25 de Outubro de 1495 falleceu João II, e Martim Bohemia voltou para o Fayal, onde residiu até 1506, anno em que tornou com a sua família para Lisboa, onde falleceu numa quinta feira 29 de Julho de 1507 (alguns dizem ter sido em 1506 e assim está na inscripção do retrato, mas damos a preferencia á inscripção mandada pòr por seu filho em 1510, n'uma lapida sepulchral á direita do altar mór no coro da egreja de Santa Catharina em Nuremberg), sendo sepultado na egreja do convento de S. Domingos. Existiram d'elle dois retratos, sendo um em corpo inteiro, que tinha por baixo inscripto: Martinns Bohemus Norimberg. Eques, Serenissimorum Johannis II et Emmanuelis Lusitaniae Regum Thalaslus et Mathematicus insignis. Obiit 1506 Lisabonae. Os portuguezes cada vez mais afoitos com a passagem do Cabo Tormentoso, ajudados com os progressos náuticos e applicação da astronomia á navegação, não conheciam obstáculos para tentarem o descobrimento de novas terras atravez dos immensos mares. O monarca João II, dando como divisa ao seu successor a esphera, parece que lhe prognosticou que no seu reinado colheria os melhores fruclos dos grandes estudos e trabalhos do immortal infante Henrique, e dos que o secundaram nas suas gigantescas aspirações.

Christovam Colombo e a America
Christovam Colombo nasceu em Génova no anno de 1437 filho primogénito de Dominico Colombo, cardador de lãs, e de sua mulher Susana Fontanarrossa. Em Pavia fez os seus estudos concernentes á navegação em que patenteou o seu grande talento, e sendo ainda muito joven andou em viagens pelo Mediterraneo como tripulante em navios mercantes e de guerra, escolhendo de preferencia expedições aventureiras. Em 1470 attrahido pelos grandiosos emprehendimentos marítimos dos portuguezes veiu estabelecer-se em Lisboa, onde nos séculos XV e XVI não havia exclusivo de nacionalidade para novos descobrimentos: empregavam-se indistinctamente os homens práticos e de reconhecido mérito, que ofereciam garantia de melhor resultado.
Alguns sabios extrangeiros não só foram consultados para essas emprezas, mas até tomaram parte activa nellas, e entre outros citaremos João Mallorca, Martim de Bohemia, João da Nova, Américo Vespucio e o próprio Christovam Colombo que fez varias viagens pelas costas de Portugal e Hespanha, alongando-se até á Guiné e á costa da Mina.
Pouco depois da sua chegada a Portugal esposou dona Filippa Moniz Perestrello, filha de Bartholomeu Perestrello (falecido em 1458), donatário da ilha de Porto Santo, e de sua mulher dona Isabel Moniz, recebendo apenas por dote, segundo dizem alguns historiadores, os mappas, itinerários e papeis de seu sogro, que havia feito parte da casa do infante Henrique e acompanhara Gonçalo Zarco no descobrimento das ilhas da Madeira e Porto Santo, recebendo em remuneração de seus serviços, em Novembro de 1446, a donataria desta ultima ilha. O genovez em seguida ao seu casamento foi para Porto Santo donde passou para o Funchal e ahi viveu de coordenar cartas maritimas. O Rodrigues Azevedo, n’um interessante artigo publicado no jornal d’aquella cidade, descreve conscienciosamente as tradições que ha ácerca da estada de Colombo na Madeira, e da casa em que ahi habitou, acompanhando a descripção uma bella photographia de Camacho (o artigo appareceu depois na Illustração hespanhola de 15 de Outubro de 1878, traduzido á lettra mas assignado por Ventura Callegon; ahi se reproduz o erro do primeiro artigo de Azevedo, dizendo o anno de 1457; motivou o engano o ter sido feita a leitura, quando a janella estava ainda no seu logar, por pessoa pouco competente). A casa indicada pertenceu á família Esmeraldo, que deu o seu nome á rua. Pela photographia reconhece-se bem que a casa, também conhecida com o nome de Granel do Poço, se compunha por ultimo de tres corpos distinctos, não só pelas divisórias mas pelo estylo architectonico, sendo os accrescentamentos posteriores feitos da esquerda para a direita.
Esta ultima parte tinha uma janella em estylo manuelino, distincta pelo seu melhor trabalho artistico, bipartida por uma columna, tendo gravado no capitel, na face esquerda, em uma moldura ms (Jesus), na do centro 1494 e na da direita MARIA. O edifício com os ditos tres corpos, em dois andares, tinha as portas em arco, as janellas de typos diversos, e não é facil acreditar que um homem que obtinha os meios de subsistência de coordenar cartas nauticas, habitasse uma casa de tão vastas dimensões. Suppomos pelo melhor critério que elle só occuparia o corpo da esquerda, o primitivo, ou o segundo, que apesar de posterior é provável estar já construído em 1480, anno em que d'alli partiu o genovez. Emquanto á parte em que está a janella bipartida evidentemente edificada quatorze annos depois, como vimos pelo decalque tirado do capitel, não podia ser habitado por Colombo, que n’essa epocha já havia feito a descoberta da America, e até partira para a sua segunda viagem ao Novo Continente». In A. C. Teixeira de Aragão, Breve Notícia sobre o Descobrimento da América, Mckew Parr Collection, Maggellan, BrandeisUniversity (Lo que nos importa), Tipografia da Academia Real das Ciências, Lisboa, 1892.

Cortesia de Academia das Ciências/JDACT