domingo, 8 de março de 2015

Dona Leonor. Princesa Perfeitíssima. João Ameal. «Em Belgrado, três anos adiante, o sultão foi detido pelas tropas aliadas de João Corvino e de Capistrano. Vitória de grande alcance, de que resultou, possivelmente, a salvação da Europa»

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Portugal. Século XV
«(…) Frente a estes países sangrados por tantas conflagrações, e ao mosaico balcânico, sempre instável e agitado, surgiu a agressividade fanática e valorosa dos turcos. Vindos do oriente, instalados há muito na Síria e na Ásia Menor, em 1356 abordaram o continente europeu e tomaram Galipoli. Em 1360, o sultão Amurate I conquistou Andrinopla; o seu sucessor, Bajazet, esmagou em 1389 os sérvios em Kossovo e fez decapitar o imperador Lázaro. O facto produziu grande impressão no Ocidente. Levantou-se uma cruzada dirigida por João sem Medo, conde de Nevers, filho do duque de Borgonha, para corresponder aos apelos insistentes de Sigismundo da Hungria. Mas Bajazet, graças aos seus velozes e terríveis janissários, surpreendeu e desfez a coligação em Nicopolis (1396). Continuou Sigismundo a heróica resistência. Depois da sua morte (1437), Ladislau I, rei da Polónia e da Hungria, juntou as suas forças, às de João Corvino e conseguiram, numa contra-ofensiva enérgica, derrotar o invasor em Nissa e expulsá-lo da Sérvia. Os príncipes gregos e o chefe albanês Scandenberg obtiveram, também, apreciáveis êxitos. Mas Ladislau sucumbiu em 1414, na planície de Varna. Amurate II, seu vencedor, prosseguiu na empresa conquistadora, até ser por sua vez morto no ataque a Croia, capital da Albânia, e o seu exército aniquilado, em Fevereiro de 1451. Outro objectivo atraía o novo sultão, Maomé II; em 1453, pôs cerco a Constantinopla e, vendida a resistência magnífica de Constantino Paleologo e dos dez mil heróis sob o seu comando, entrou na velha metrópole bizantina. A cabeça ensanguentada do imperador Constantino foi exibida na ponta de uma lança turca...
Em Belgrado, três anos adiante, o sultão foi detido pelas tropas aliadas de João Corvino e de Capistrano. Vitória de grande alcance, de que resultou, possivelmente, a salvação da Europa. Corvino não pode explorá-la e invadir a Turquia, como projectava, porque a morte cortou nesse mesmo ano de 1456 a sua carreira épica. O perigo, todavia, mantém-se. Um a seguir a outro, os vários papas que ocupam a cadeira de Pedro lançam os seus apelos aos Chefes da Europa, pregam outra vez a Cruzada contra o Infiel. Assim fazem Martinho V e Eugénio IV; Nicolau V multiplica-se em esforços ansiosos, tanto mais que durante o seu pontificado se dá a queda de Constantinopla; Calixto III segue no mesmo trilho.
Dividida, tanto na alma como no corpo, a Europa não responde já à chamada de Roma. Parece ter deixado de existir a respublica christiana, em que todos os povos e todos os príncipes, fiéis aos mesmos ideais, se ligavam apenas soasse a grande voz do Pastor Comum. Agora, o Santo Padre contempla, cheio de angústia, o imenso campo de ruínas. Não encontra quem lhe dê ouvidos, quem siga a palavra de ordem do representante de Cristo na Terra. E o Turco bate, ameaçador, infatigável, às portas do Ocidente. Acabou, de facto, a Idade-Média? Não existe já qualquer parcela do seu espírito em recanto algum da EuropaIn João Ameal, Dona Leonor, Princesa Perfeitíssima, Academia Portuguesa de História, Colecção Rainhas e Princesas de Portugal, Livraria Tavares Martins, Porto, 1943.

Cortesia de LTMartins/JDACT