domingo, 7 de setembro de 2014

O Silêncio e as Vozes. Maria Sarmento. «De madrugada, alguém bate à porta da casa das memórias. Com gestos lentos a mãe segura a noite e o dia e abre uma estrada que vai do céu à terra»

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«No soalho da casa das memórias
oiço estalar o tempo.
Os odores e as vozes cantam
para adormecer o passado.

A voz da Mãe, grandiosa e única,
ecoa por todos os lugares da casa.
Então, eu choro em silêncio
para não acordar os fantasmas
que a memória alimenta no seu colo».


«Pior do que morrer
é perder a memória.
Terem vendido a casa
e alugado os seus fantasmas.

Pior do que morrer
é estar perdido,
não reconhecer os cheiros
e os sabores da infância.

Fantasma errante
flanando ao longo do rio
de onde já não partem
nem chegam barcos
para lugar nenhum.

Um porto moribundo.
Eis o que resta da alegria!»
Poemas de Maria Sarmento, in ‘O Silêncio e as Vozes

In Maria Sarmento. O Silêncio e as Vozes, colecção O Guardador de Rebanhos, Aríon Publicações, Lisboa, 1999, ISBN 972-8409-09-5.

Cortesia de Aríon/JDACT