quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Um Rei Avesso à Política. Fernando II. Maria Antónia Lopes. «De tal forma que logo na década de 1840 Augusto Scheler afirma que a história moderna não oferece um segundo exemplo de uma Casa soberana que, no espaço de uma geração, tenha engrandecido tanto os seus estados hereditários e preenchido três tronos europeus, a Bélgica, a Grã-Bretanha e Portugal»

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Antes de Portugal (1816-1836). A família Coburgo
«(…) O destino de Leopoldo não ficou por aqui. Em 1830 ofereceram-lhe a coroa da Grécia, provocando a fúria da mãe ao vê-lo interessado. Leopoldo recusou, mas no fim da vida sentia-se arrependido da sua decisão. Logo no ano seguinte conseguiu um trono civilizado, que mereceu a aprovação de todos, quando os Belgas o elegeram como seu primeiro rei. Precisava agora de uma rainha e de descendentes, como precisava do apoio da França, vizinho demasiado poderoso, cujas ambições expansionistas tinham de ser amainadas e que importava converter em aliado de peso, se a Holanda não desistisse de reincorporar a Bélgica. Conseguiu o que queria, mais uma vez, ao casar-se com Luísa de Orleães (1812-1850), filha do rei dos Franceses.
Deste casamento nasceram os últimos primos coirmãos de Fernando Augusto, que, pela idade, já pertenciam à geração seguinte: Leopoldo (1835-1909), que sucederá, ao pai, Filipe (1837-1905), conde da Flandres, que virá, a casar com a irmã da defunta rainha Estefânia de Portugal; e Carlota (1840-1927), a quem os Coburgos destinavam o nosso rei Pedro V mas se uniu a Maximiliano, que era irmão do imperador Francisco José da Áustria e foi efémero imperador do México.
Muito antes disto, em 1817, ano da morte de Carlota e do desfazer dos sonhos britânicos de Leopoldo, casou o chefe do clã Coburgos, o irmão Ernesto III de Saxe-Coburgo-Saalfeld, com Luísa de Saxe-Gotha-Altenburg, uma adolescente de 16 anos, escolhida por ser uma das herdeiras do duque soberano de Gotha-Altenburg, que não tinha descendentes directos. Com a morte deste foi possível agregar os ducados, geograficamente descontínuos, de Coburgo e de Gotha, naTuríngia. A reestruturação de ducados, provoca da pela extinção da Casa de Saxe-Gotha-Altenburg, implicou a cedência de Saalfeld por parte de Ernesto, que assumiu o título de Ernesto I de Saxe-Coburgo-Gotha. Foi só então, em Novembro de 1826, que os membros masculinos da família Coburgo adoptaram esses apelidos, tinha o futuro rei de Portugal 10 anos de idade.
O casamento de Ernesto com Luísa Saxe-Gotha-Altenburg foi desastroso. Luísa deu à luz, em anos sucessivos, Ernesto (1818-1893), futuro Ernesto II, e Alberto (1819-1861), futuro príncipe consorte de Inglaterra, mas em 1824 o duque descobriu que a mulher tinha um amante. Ernesto fora sempre infiel, mas não perdoou. Luísa foi expulsa de Coburgo, levada durante a noite para impedir os protestos da população, que se manifestara a seu favor, e separada dos filhos, que não mais tornou a ver por imposição do marido. Este só fez avançar o divórcio depois da morte do duque de Gotha, em Fevereiro de 1825, embora Augusta o pressionasse já antes disso porque receava que ele voltasse a receber a esposa. Mas Ernesto manteve-se inflexível e a família Coburgo reteve a herança de Luísa, já, banida dos seus territórios.
Além deste infeliz episódio, impossível de ocultar, correu o rumor de um segredo inconfessável: Alberto, nascido em 1819, não seria filho de Ernesto, mas do tio Leopoldo, o que explicava o interesse e afecto que este último sempre demonstrou pelo sobrinho. Não há fontes que comprovem esta versão. Luísa casou em 1826 com o antigo amante e viria a falecer em Paris, em 1831, angustiada porque os filhos a teriam esquecido e ninguém lhes falava dela. Ernesto contraiu segundas núpcias no ano imediato com a sobrinha Maria, filha de Antonieta. Não houve filhos deste casamento e Ernesto e Alberto, que eram primos direitos da madrasta, foram ensinados a trata-la por mãe.
Esta nova geração continuaria a erguer o prestígio da família. De tal forma que logo na década de 1840 Augusto Scheler afirma que a história moderna não oferece um segundo exemplo de uma Casa soberana que, no espaço de uma geração, tenha engrandecido tanto os seus estados hereditários e preenchido três tronos europeus, a Bélgica, a Grã-Bretanha e Portugal. De facto, seria agora a vez de se ligarem aos Braganças de Portugal, novamente aos Hanôvers ingleses, mas também aos Orleães de França. Tentaram, sem o conseguir, ocupar o trono da Grécia, casar um dos seus com a rainha Isabel Bourbon de Espanha e mais tarde ocupar esse trono. Estes novos Coburgos eram Fernando Augusto, os irmãos e os seus primos direitos que se apresentaram. Os seus filhos, por sua vez, criaram laços de parentesco estreito com os Habsburgos da Áustria, os Hohenzollerns da Prússia, os Saboias de Itália, os Braganças do Brasil, as Casas reinantes da Saxónia real, Baviera e Dinamarca, fundando mesmo uma nova dinastia, a do reino da Bulgária, cujo primeiro monarca foi um sobrinho de Fernando, filho de Augusto». In Maria Antónia Lopes, D. Fernando II, Um Rei Avesso à Política, Círculo de Leitores, 2013, ISBN 978-972-42-4894-3.

Cortesia de CL/JDACT