domingo, 16 de março de 2014

Estelas e Terra Amarela. Victor Segalen. «Que vê ele ao fundo do buraco cavernoso? A noite sob a terra, o Império de sombra. Eu, dobrado sobre mim e encarando o meu abismo, “ó eu! Estremeço” sinto-me cair, desperto e já só a noite quero ver»

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Estelas viradas para o meio-dia. Os três hinos primitivos
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Os três hinos primitivos a que os três Regentes haviam chamado Os Lagos, O Abismo, Nuvens, estão apagados de todas as memórias. Que sejam assim recompostos:

Os Lagos
Os lagos afogam nas palmas redondas das suas mãos o rosto do Céu: Rodei a esfera para observar o Céu.
Os lagos, sacudidos por ecos fraternos, em número de doze: Fundi os doze sinos que fixam os tons musicais.
Lago movediço, firmamento líquido ao invés, sino musical, que o homem que recebe os meus compassos igualmente ecoe sob o poderoso Céu-Soberano. Para tal dei nome ao hino do meu reinado: os Lagos.


O Abismo
Face a face com as profundezas, recolhe-se o homem, de cabeça inclinada. Que vê ele ao fundo do buraco cavernoso? A noite sob a terra, o Império de sombra.
Eu, dobrado sobre mim e encarando o meu abismo, ó eu! Estremeço, sinto-me cair, desperto e já só a noite quero ver.

Nuvens
São os pensamentos visíveis do alto e puro Senhor-Céu. Alguns compassivos, cheios de chuva. Outros atroando os seus cuidados, suas justiças, suas sombrias iras.
Que o homem que recebe as minhas liberalidades ou curvado sob os meus golpes conheça através de mim, o Filho, os desígnios do Céu ancestral. Para tal dei nome ao hino do meu reinado: Nuvens.

In Victor Segalen, Stèles, Terre Jaune, Pequim 1912, Edições La Difference, Paris, 1989, Edições Cotovia, Lisboa, 1996, Fundação Oriente, ISBN 972-8028-72-5.

Cortesia de FOriente/JDACT