quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Invasão Liberal no Algarve. A Derrocada do Absolutismo. Mário Domingues. « A esquadra absolutista não só foi derrotada como também ficou quase totalmente em poder dos constitusionais. Apenas a Isabel Maria e a Cíbele puderam fugir, regressando salvas a Lisboa»

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A Esquadra Miguelista Derrotada e Apresada
«(…) Por outro lado, acodem ao sul do país as tropas do brigadeiro Raimundo, enviadas de Lisboa, e, em Coimbra, o brigadeiro Nuno Augusto Taborda, vindo do Porto com uma brigada, anexava às suas forças um batalháo de infantaria 8, outro de infantaria 17 e um esquadrão de cavalaria 4, milícias de Aveiro, realistas de Penafiel e duas bocas de fogo. Entretanto, precisamente a 2 de Julho, o vice-almiranrüe Napirer saía de Lagos, tomando o rumo de Lisboa. Sucedia, porém, que na véspera largara da capital a esquadra miguelista com ordem de combater a frota constitucional. Foi um erro crasso do governo, pois em virtude de os navios não estarern preparados para operação de tal envergadura, os comandantes manifestaram relutância em partir em tais condições. Embarcara, por assim dizer, à força. Era António Correia Aboim quem comandava a esquadra absolutista, enquanto não chegava o capitão de marinha inglesa Eliot, contratado em Londres pelos agentes de Miguel. Compunha-se a referida esquadra dos seguintes nove navios: naus D. João IV e Rainha, fragatas Martim de Freitas e Princesa Real, corvetas Isabel Maria, Princesa Real e Cibele e brigues Tejo e Audaz.
Foi pelas oito honas da manhã do dia 3 que por alturas de São Vicente os marinheiros liberais avistaram velas miguelistas. De um e outro lado se procedeu a manobras, tomando posições para uma batalha. Esta, porém, não viria a ferir-se senão no dia seguinte,quando o mar, mais calmo, se tornara propício. O entrectroque foi terrível, segundo o relato do próprio vice-almirante britânico. Apesar da má vontade e das precárias condições morais em que embarcaram, os marinheiros absolutistas bateram-se com arreganho. Mas não puderam resistir ao grande poder dos liberais, superiormente comandados por um autêntico lobo-do-mar, valente e sabedor. A esquadra absolutista não só foi derrotada como também ficou quase totalmente em poder dos constitusionais. Apenas a Isabel Maria e a Cíbele puderam fugir, regressando salvas a Lisboa. O brigue Audaz tratou de reunir-se em Lagos à esquadra liberal, e o Tejo, abandonando igualmente a esquadra miguelista, foi ter à ilha da Madeira. Assim, no dia 5 de Julho de 1833, Lisboa, que até então era considerada pelos miguelistas a cabeça do Estado Absolutista, achou-se desamparada de qualquer defesa por mar. Encontrava-se no começo do declive para a sua derrota total.

O infante Miguel festeja uma derrota
A notícia de que o vice-almirante Napier largara do Porto com rumo ao Sul, possivelmente a Lisboa; onde o Absolutismo parecera ter criado fundas raízes, dera ânimo ao infante Miguel, que entretanto aguardava com impaciência um novo chefe militar capaz de emendar a triste série de erros cometidos pelos generais que se tinham mostrado incapazes de vencer a resistência das forças liberais instaladas no Porto. A falta de confiança nos generais portugueses levara o infante usurpador a optar pela escolha de um marechal francês, cuja história militar parecia adaptar-se melhor à sorte das armas absolutistas. Era este o conde de Chaisme de Bourmont, o mesmo que, em 1815, por ocasião da batalha de Waterloo, traíra Napoleão, desertando para as fileiras contrárias. Depois, em 1830, fora-lhe atribuído o comando superior a 40000 homens que a França expediu contra o rei da Argélia. Conseguiu com eles anexar aos domínios franceses a importantíssima colónia argelina aos riquíssimos domínios franceses, o que lhe valeu o bastão de marechal precisamente na altura em que teve de homiziar-se com Carlos X, o rei a quem servira.
Devia-lhe Portugal a seguinte prova moral: como agradecimento por ter recebido hospitalidade neste país quando em 1804 se evadira de Besanção, onde o tinham encarcerado por questões políticas, Bourmont aceitou, em 1807, o cargo de chefe do estado-maior da divisão do célebre Loison, na invasão francesa comandada por Andoche Junot. Era Bourmont o general que as forças retrógradas iam ter agora à sua frente. Enquanto aguardavam a chegada do novo chefe militar para se decidirem a mais uma tentativa contra o Porto, divulgaram a notícia de ter ficado a cidade apenas defendida por voluntários paisanos e alguns estrangeiros, afirmando que toda a tropa liberal da primeira linha já embarcara. Apressaram os necessários preparativos de um novo ataque, por vezes presidido pelo próprio infante Miguel, que dera em visitar quase todos os dias os seus acampamentos, mas já preocupado com o desfecho da luta». In Mário Domingues, A Derrocada do Absolutismo, Evocação Histórica, Edição Romano Torres, série Lusíada, Lisboa, 1977.

Cortesia de R.Torres/JDACT