sexta-feira, 12 de julho de 2013

Música. Finlândia. Jean Sibelius. «Nada nem o branco fogo do trigo nem as agulhas cravadas na pupila dos pássaros te dirão a palavra. Não interrogues não perguntes entre a razão e a turbulência da neve não há diferença. Não colecciones dejectos o teu destino és tu. Despe-te. Não há outro caminho»


Sibelius e Aino
Cortesia de wikipedia


Os navios existem, e existe o teu rosto
encostado ao rosto dos navios.
Sem nenhum destino flutuam nas cidades,
partem no vento, regressam nos rios.

Na areia branca, onde o tempo começa,
uma criança passa de costas para o mar.
Anoitece. Não há dúvida, anoitece.
É preciso partir, é preciso ficar.

Os hospitais cobrem-se de cinza.
Ondas de sombra quebram nas esquinas.
Amo-te... E entram pela janela
as primeiras luzes das colinas.

As palavras que te envio são interditas
até, meu amor, pelo halo das searas;
se alguma regressasse, nem já reconhecia
o teu nome nas suas curvas claras.

Dói-me esta água, este ar que se respira,
dói-me esta solidão de pedra escura,
estas mãos nocturnas onde aperto
os meus dias quebrados na cintura.

E a noite cresce apaixonadamente.
Nas suas margens nuas, desoladas,
cada homem tem apenas para dar
um horizonte de cidades bombardeadas.

Poema de Eugénio de Andrade, in ‘Poesia e Prosa’


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