quinta-feira, 21 de março de 2013

Cartas do Japão. 1904. Antes da Guerra (1902-1904). Wenceslau de Moraes. «Deve presumir-se que ambas concorram para a manutenção da paz, que se equilibrem, com o que as actividades comerciais de todo o Extremo- Oriente…»

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Cartas do Japão. 8 de Abril de 1902
A aliança anglo-japonesa - Exposição industrial nacional de Osaka
«O que ultimamente mais tem ocupado o espírito deste bom povo é a aliança anglo-japonesa; festas, discursos elogiosos, largos comentários na imprensa, enfim todas as manifestações do orgulho nacional, que neste país é supino, excitado pelo magno acontecimento de vir uma prestigiosíssima nação da Europa dar as mãos ao Japão, para em comum cuidarem dos seus mútuos interesses no Extremo-Oriente, tudo isto tem agitado o teatro de multíplices intrigas e cobiças. É, pois, bem justificável o entusiasmo japonês.
Para os estranhos que pretendem julgar imparcialmente os acontecimentos, é ainda impossível fazer um juízo sobre a aliança anglo-japonesa e sobre a que logicamente se lhe seguiu, a aliança franco-russa. Deve presumir-se que ambas concorram para a manutenção da paz, que se equilibrem, com o que as actividades comerciais de todo o Extremo- Oriente e a remodelação civilizadora, lenta mas fatal, da China e da Coreia, terão tudo a ganhar. No entretanto, e referindo-me particularmente ao império do Sol Nascente, a situação criada tem seus perigos, um dos quais, quando outros não haja, pode consistir num possível excitamento do orgulho do povo, do seu espírito guerreiro, arrastando a nação a enormes despesas com o aumento das suas forças militares e navais, comprometendo assim seriamente o estado financeiro do país, já pouco florescente. Confiemos, no entretanto, que este extraordinário povo, que tem dado ao mundo exemplos notabilíssimos da sua perspicácia, que soube em pouco mais de trinta anos surgir do seu isolamento misterioso para a civilização moderna, e de modo a tornar-se já hoje respeitado como um grande Estado, compreenda claramente a sua situação e o justo caminho que deve seguir no intuito do seu progressivo engrandecimento.
A par da aliança, um outro assunto está ocupando os japoneses, e este inquestionavelmente de paz, de progresso e de seguros benefícios: refiro-me à próxima 5.ª Exposição industrial nacional, que deve ser inaugurada em Osaka em Março de 1903, permanecendo aberta durante cinco meses. Já se trabalha mui activamente nas diversas construções requeridas e tudo leva a crer que tal exposição será por muitos títulos interessante, de grande alcance mercantil, digna enfim da cidade de Osaka, que é o centro produtor industrial mais importante de todo o império. Esta 5ª Exposição industrial nacional oferecerá a novidade de conter um vasto pavilhão especialmente destinado a amostras estrangeiras, visando o duplo fim de concorrer a melhorar as novas indústrias indígenas e de criar novos mercados. Prevê-se já que a Europa e a América se farão largamente representar.
Será Portugal representado na próxima Exposição japonesa? Enviarão a Osaka os negociantes portugueses, do reino e das colónias, amostras de alguns dos produtos do país? Presumo que sim, e desejo-o ardentemente, parecendo-me que a completa ausência de tais produtos constituiria facto muito lamentável. Os nossos negociantes abastados e empreendedores deverão mesmo fazer mais: deverão aproveitar esta ocasião excepcionalmente favorável para enviarem ao Japão algum ou alguns dos seus representantes, um individuo poderá muito bem encarregar-se dos interesses de três ou quatro firmas mercantis, os quais devem mirar a um duplo intuito: tentarem fazer conhecidos aqui alguns dos nossos produtos e adquirirem abundantes amostras de artigos indígenas para torná-los conhecidos em Portugal». In Wenceslau de Moraes, Cartas do Japão, Antes da Guerra (1902-1904), prefácio de Bento Carqueja, Livraria Magalhães & Moniz, Editora, Oficinas do Comércio do Porto, Porto, 1904.

Cortesia de L. Moniz/JDACT