terça-feira, 20 de novembro de 2012

Cartas de Soror Mariana Alcoforado. Das Lettres Portugaises. Leonel Borrela. «Os séculos XVII, XVIII e boa parte do XIX, privilegiaram a língua francesa, o idioma que mais se falava, lia e escrevia, em quase todo o ocidente europeu dominado pelas Luzes e pela nova realidade política, após Revolução Francesa»

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Quantidade e Qualidade nas Lettres Portugaises
«Concluído o inventário das obras bibliográficas da Colecção Alcoforadina  optámos por aplicar uma metodologia que vá ao encontro da que utilizou Fernando Guedes. O autor, após contextualizar a problemática da influência das Luzes no final de setecentos em Portugal, apresenta os resultados das suas análises quantitativas e qualitativas realizadas sobre o manancial de informação bibliográfica extraído de onze catálogos de livreiros lisboetas, de 1777 a 1797, cujas lacunas para os anos em falta preencheu com as listas de impressões efectuadas na Régia Oficina Tipográfica. Do mesmo modo procederá com a análise do primeiro quartel do século XIX. Enquanto F. Guedes analisa, de entre vastos sectores, livros de moral, filosofia, direito, história e novelas, caracterizando as mudanças de política editorial, aliadas à leitura, far-se-á uma incursão por algumas das principais obras que autores, ensaístas, escritores, artistas, políticos, actores, poetas, etc. e editores nos propiciaram na concepção de um livro temático, o das Lettres Portugaises.
Assim, viajaremos dos seculos XVII ao XXI; da Edição Princeps a uma das mais recentes; dos idiomas francês, passando por uma dezena de outros, até ao japonês, ao longo de 485 exemplares manifestamente impossíveis de valorizar individualmente.
No âmbito da edição internacional das Lettres Portugaises, as línguas francesa e portuguesa ocupam actualmente o lugar de destaque, embora em proporções desiguais, com grande vantagem para Portugal, mas nem sempre foi assim. Com efeito, os séculos XVII, XVIII e boa parte do XIX, privilegiaram a língua francesa, o idioma que mais se falava, lia e escrevia, em quase todo o ocidente europeu dominado pelas Luzes e pela nova realidade política, após Revolução Francesa (1789), de cariz republicano e liberal,  como revelam mais de sessenta edições publicadas, entre 1669 e 1747, em Paris, Grenoble, Lyon, Tournay, Colónia, Amesterdão, Haia, Bruxelas e Antuérpia. Ainda no século XVII, segundo o bibliófilo José dos Santos, virão a lume:
  • de Londres, em 1678, na língua inglesa, traduzida do francês por Roger L’Estrange, Five loveletters from a nun to a cavalier editado por Henry Brome; 
  • de Veneza, em italiano, no ano de 1682, as Lettere Amorose Portvghesi […] Trasportate dal Portughese in Francese, e dal Francese in Italiano, por Narbonte Pordone.
o século XVIII trar-nos-á uma edição alemã, de Rotenburg, datada de 1788, há outra mais antiga, Briefewechfed eine Portugiesisher none. No século XIX ainda saem do prelo boas edições francesas e bilingues luso-gálicas. Vê-se como era pobre o panorama das edições extra francófonas. Só a partir do século XIX, muito depois da Inglaterra, Países Baixos, Alemanha e Itália (Veneza), Portugal despertou, via nota Boissonade (1810), para a realidade cultural das Lettres, e, desde então, queremo-las tão portuguesas, que não param as edições, agora envolvidas por um crescente interesse internacional.

NOTA: As cartas também serviram para animar os descontentes do Portugal liberal, do nacionalismo crescente na transição de oitocentos. Numa edição popular de Luciano Cordeiro (1894), podemos ler o testemunho de Oliveira Martins (1845-1894): ‘Meu querido Luciano. Vibrei certamente, vibrei todo o dia ontem [alusão a uma frase da carta em que Luciano lhe oferecia um exemplar da 1.ª edição de Soror Marianna], lendo a sua primorosa obra. V. fez um milagre. Não queria escrever-lhe agradecendo o seu livro, antes de o ler, e não o li logo porque o tinha em prestado ao Moniz Barreto para ele escrever o artigo que lhe pedi e V. já leu, de certo. O Repórter cumpriu o seu dever. O livro das Cartas que V. fez é verdadeiramente definitivo; não há mais nada a dizer. V. esgotou a erudição e a crítica: não há que rebuscar nem observar mais. Está definido o caso patológico (?) e determinado o concurso de circunstâncias que se deu. Receba pois V., meu querido Luciano, os meus mais cordiais parabéns e creia-me sempre - Seu velho amigo, de uma amizade sempre moça’.

Do que conhecemos, fora das parcelas inventariadas da nossa colecção, e que, como complemento de estudo, consideremos importante, daremos notícia, pois será a maneira mais correcta de valorizarmos, ainda que de forma subsidiária, a historia do Livro e da Leitura, as Lettres Portugaises, Mariana Alcoforado e sua cidade de Beja». In Leonel Borrela, Cartas de Soror Mariana Alcoforado, Edição 100Luz, 2007, ISBN 978-972-99886-7-7.

Cortesia de 100Luz/JDACT