domingo, 9 de setembro de 2012

A Bela Poesia. Sonetos. Bocage. Período da vida militar, 1780 a 1787. «Enquanto o sábio, enfim, mais sabiamente se remonta nas asas do sentido à corte do Senhor omnipotente. Eu louco, eu cego, eu mísero, eu perdido, de ti só trago cheia, ó Jónia, a mente; do mais, e de mim mesmo, ando esquecido»


Cortesia de pro20

Receios de Mudança no Objecto Amado
Temo que a minha ausência e desventura
vão na tua alma, docemente acesa,
apoucando as excessos da firmeza,
rebatendo os assaltos da ternura.

Temo que a tua singular candura
leve o Tempo fugaz nas asas presa,
que é quase sempre o vício da beleza
génio mudável, condição perjura.

Temo; e se o fado mau, fado inimigo,
confirmar impiamente este receio,
'spectro perseguidor, que anda comigo,

com rosto, alguma vez de mágoa cheio,
recorda-te de mim, dize contigo:
‘era fiel, amava-me, e deixei-o’.

Cortesia de wikipedia

Achando-se Avassalado pela Formosura de Jónia
Enquanto o sábio arreiga o pensamento
nos fenómenos teus, ó Natureza,
ou solta árduo problema, ou sobre a mesa
volve o subtil geométrico instrumento.

Enquanto, alçando a mais o entendimento,
estuda os vastos céus, e com certeza
reconhece dos astros a grandeza,
a distância, o lugar e o movimento.

Enquanto o sábio, enfim, mais sabiamente
se remonta nas asas do sentido
à corte do Senhor omnipotente.

Eu louco, eu cego, eu mísero, eu perdido,
de ti só trago cheia, ó Jónia, a mente;
do mais, e de mim mesmo, ando esquecido.

In Bocage, ‘Sonetos, período da vida militar (1780-1787)'

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