sábado, 19 de maio de 2012

Arqueologia e Património Construído na Região do Alto Tejo Português. «Os mais antigos acampamentos do homem pré-histórico, no Paleolítico Inferior e no Paleolítico Médio, podem ser encontrados nos terraços do Tejo, junto a Vila Velha de Ródão. Na Fonte das Virtudes e na Foz do Enxarrique o Homem de Neandertal deixou fortes marcas da sua presença nesta região»


Gravura antiga das Portas do Ródão
Cortesia de wikipedia

Um olhar diacrónico sobre o território humanizado
«A região da Beira Interior Sul é banhada pelo grande rio peninsular, o Tejo. É um território de contrastes geo-ambientais, onde, para além do grande rio, se inscrevem algumas das mais altas serras do distrito de Castelo Branco, bacias aluvionares, superfícies planálticas e, consequentemente, ecossistemas variados, embora alteradas pelo Homem ao longo de milénios.
Sendo uma zona de trânsito obrigatório entre o Norte e o Sul do território continental e entre o interior da Meseta e o litoral era previsível que o homem que por aqui tivesse passado e se tivesse fixado, desde as épocas mais remotas, de um forma permanente e rica de interacções culturais. A arqueologia deste território e o diversificado património que ainda nele se conserva, embora muito delapidado nos últimos trinta anos, comprovam essa perspectiva.
Os mais antigos acampamentos do homem pré-histórico, no Paleolítico Inferior e no Paleolítico Médio, podem ser encontrados nos terraços do Tejo, junto a Vila Velha de Ródão. Na Fonte das Virtudes e na Foz do Enxarrique o Homem de Neandertal deixou fortes marcas da sua presença nesta região.
Bem perto, para montante e jusante das Portas de Ródão, ao longo de cerca de 40 km de margens do Tejo e seus afluentes, entre os concelhos de Nisa e Vila Velha de Ródão situou-se um dos mais expressivos santuários póspaleolíticos ao ar livre, de toda a Europa. Trata-se de um conjunto de mais de 30 000 figuras, geométrico-simbólicas, representações de homens e de animais, em grande parte submersas pela albufeira de Fratel, ilustrando um pensamento mágico-religioso já muito complexo.

Idanha a Velha

As comunidades responsáveis por essas obras de arte gravadas na pedra enterraram os seus mortos em sepulturas megalíticas (antas e mamoas) de que se conservam algumas centenas principalmente no sul de Idanha-a-Nova, em Proença-a-Nova e em Nisa. Estes monumentos encontram-se entre as mais antigas obras de “arquitectura” conservadas nesta região. Da etapa seguinte da presença humana, durante as Idade do Bronze e do Ferro, conhecem-se principalmente povoados situados em pontos elevados, como o Monte de São Martinho (Castelo Branco), nos picos graníticos da área de Monsanto (Idanha-a-Nova) ou no extremo de cristas quartzíticas como em São Miguel (Nisa) ou no Muradal (Oleiros), locais por excelência de controlo da paisagem e da mobilidade das gentes. Os achados de armas ou jóias metálicas, em bronze, em prata ou ouro, fazem aparição por toda a região, evidenciando a importância dos objectos de prestígio naquelas comunidades.
A região tem a particularidade de se situar em plena nação lusitana, abrangendo os territórios de dois importantes populi, os Igaeditani e os Tapori. E segundo os historiadores clássicos, as bodas de Viriato ter-se-ão realizado algures neste último território, onde viveria Astolpas o seu sogro. Mas, é certamente com a Romanização que ocorre o mais profundo processo de ordenamento deste território e de exploração dos seus recursos naturais, até à exaustão. Na complexa e hierarquizada rede de povoamento que então se estabelece emerge a velha Egitânia (Idanha-a-Nova), importante cidade, sede de civitas cujo esplendor chega até aos tempos medievais e que contém a maior concentração de inscrições da Península. Entretanto muitos outros vestígios, nomeadamente de vilas, se encontram por toda a campina de Idanha e Castelo Branco, e neste último concelho, especialmente no triângulo sagrado situado entre São Martinho, Senhora de Mércoles e Santa Ana.
Por toda a região, constroem-se inúmeras obras de engenharia que sobrevivem, por vezes com uso quase até à actualidade, como pontes, calçadas (como as de Alpedrinha), barragens. Exploram-se as melhores terras de aluvião. Da Idanha-a-Nova a Nisa e a Oleiros exploram-se minerais metálicos, a céu aberto ou em galeria, e ouro de aluvião cuja marca mais impressiva se encontra no vasto Conhal (Nisa) situado a jusante das Portas de Ródão.

Arte rupestre

Com a queda do Império atravessam-se tempos conturbados até à consolidação do Reino de Portugal. Esta será durante muito tempo uma terra de fronteira entre os reinos cristãos e muçulmanos, onde as ordens militares, do Templo, do Hospital e de Cristo, vão dar um contributo definitivo à construção de uma nova realidade cujos símbolos e instrumentos, do novo poder, são os inúmeros castelos da Raia que pontuam locais estratégicos em quase todos os concelhos do sul da Beira.
Com o advento da contemporaneidade há uma outra realidade que percorre e irmana todos estes concelhos. São as invasões militares vindas de leste, nos séculos XVIII e XIX. Os exércitos invasores entravam na Idanha deixando rasto de conflitos, pilhagens e destruições por toda a região, onde ainda se ouvem inúmeros relatos, sob a forma de lendas e sítios com história. Chegados à muralha natural constituída pelas serras das Talhadas, do Muradal e dos Álvelos ainda se podem ver fortes e baterias posicionados sobre as zonas de passagem obrigatória na rota para Lisboa. De entre estes merecem destaque as fortificações da Ponte do Alvito, na fronteira entre Proença-a-Nova e Castelo Branco e os de Vila Velha de Ródão, protegendo a passagem do rio na área das Portas». In Associação de Estudos do Alto Tejo, Arqueologia e Património Construído na Região do Alto Tejo Português, PDF.

Cortesia de AE do Alto Tejo/JDACT