segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

O Infante D. Pedro das “Sete Partidas”. Parte 1. Vida e Obra: «Em Veneza, o maior centro económico do século XV, visitou os arsenais, informou-se sobre o comércio oriental, adquiriu o livro de Marco Pólo, com notícias da China e das suas riquezas, e provavelmente um mapa-mundi com o traçado das rotas comerciais com o Oriente»

Pranto pelo infante dom Pedro das sete partidas:

Nunca choraremos bastante nem com pranto
Assaz amargo e forte
Aquele que fundou glória e grandeza
E recebeu em paga insulto e morte.
Sophia de Mello Breyner Andresen, 1961.


Cortesia de historiaportugal 

Vida e Obra
«O infante D. Pedro é, para muitos historiadores, uma personalidade axial da história portuguesa. Personalidade axial mas mal tratada: caído em desgraça, a sua memória foi deliberadamente apagada ou distorcida. Não recebeu só «insulto e morte», recebeu também esquecimento. Só nos séculos XIX e XX a sua figura e actuação política foram reavaliadas e historicamente valorizadas, ainda que continue a ser, por vezes, “julgado à luz de sectarismos ineptos”, impossibilitadores de um julgamento justo.

O Infante, quarto filho do rei D. João I e da rainha D. Filipa de Lencastre, nasceu em Lisboa, a 9 de Dezembro de 1392. Da sua educação sabemos que foi muito dedicado ao estudo desde a infância e versado em ciências e letras. Participou nos preparativos para a conquista de Ceuta, tendo presidido ao levantamento das tropas na região de Lisboa e Sul do país, e comandou um dos corpos militares que conquistaram a referida cidade em 1415.
Nesta data foi nomeado Duque de Coimbra, tendo-lhe sido atribuídas terras e povoações na região do Baixo Mondego e a faixa litoral até Aveiro. Entre 1425 e 1428 viajou pela Europa, visitando os grandes centros políticos, económicos e culturais de então (Londres, Bruges, Veneza, Roma), a Alemanha, a Hungria e a Espanha.
Pessoa esclarecida e atenta às necessidades do país, aproveitou o contacto internacional para se actualizar, dinamizar as relações económicas com a Flandres, recolher informações e propor soluções inovadoras para os problemas nacionais. Neste sentido, escreveu ao irmão, o futuro rei D. Duarte, uma notável carta, a carta de Bruges (1526), em que sugere um conjunto de reformas para solucionar os problemas da sociedade portuguesa de então. Em Veneza, o maior centro económico do século XV, visitou os arsenais, informou-se sobre o comércio oriental, adquiriu o livro de Marco Pólo, com notícias da China e das suas riquezas, e provavelmente um mapa-mundi com o traçado das rotas comerciais com o Oriente. Destas suas viagens ficou-lhe o cognome de “Infante das Sete Partidas”.

Entre 1429 e 1439 fixou-se no seu ducado, dedicando-se ao desenvolvimento económico e social das terras e habitantes. Durante este período impulsionou a tradução para português de diversas obras de autores latinos, tendo ele próprio traduzido e adaptado algumas e finalizou, com a colaboração de Frei João Verba, a composição do livro “Da Virtuosa Benfeitoria”. Esta obra é uma importante por dois motivos:
Não se conhece ao certo nenhum retrato do Infante D. Pedro,
ainda que ele esteja representado nos Painéis de S. Vicente,
possivelmente na figura que se apresenta, do Painel dos Cavaleiros,
dada a congruência com a sua descrição física directa.
Cortesia de paineis 

  • O infante foi não só o primeiro autor de prosa doutrinal em língua portuguesa;
  • como também um dos criadores da própria língua, pela maneira como escreve e pelos vocábulos novos que utiliza, de origem latina e grega.
Por exemplo, é o primeiro autor a usar a palavra “poesia”, dando dela uma definição magistral, «poesia é mais sabor do que saber». Como homem de cultura há ainda a mencionar três outros aspectos:
  • o impulso que deu, quando Regente, à continuação das obras do Mosteiro da Batalha,
  • a chamada do primeiros humanistas italianos a Portugal, como Mateus Pisano, para servir de professor ao futuro rei,
  • o apoio à escultura e pintura, com destaque para os pintores Afonso Gonçalves e João Gonçalves (este último, autor das pinturas do claustro da abadia de Florença).
Em 1436, numa intervenção fortemente critica no Conselho Real, bem demonstrativa da sua lucidez e visão política, tentou contrariar a conquista de Tânger e a expansão em Marrocos, considerando-a como ruinosa para os recursos do país. Já antes, na Carta de Bruges, analisara a questão de Ceuta em termos de «muy bom sumidouro de gente da vossa terra e de armas e de dinheiro». Mais tarde, como Regente, não abandonará Ceuta; mas também não dará qualquer seguimento a conquistas em Marrocos.
Na sequência da morte prematura do rei D. Duarte (1438), e sendo menor o futuro rei Afonso V, a rainha D. Leonor assumiu as funções de regente do reino com o apoio da grande nobreza senhorial. Mas esta regência foi contestada particularmente pelos povos dos concelhos, com Lisboa e o Porto à frente do movimento. Gerou-se um clima de tensão política de que resultou o Infante D. Pedro ter sido aclamado Regente do reino nas cortes de Lisboa de 1439 com o apoio expresso dos concelhos e em detrimento dos interesses do partido da grande nobreza que apoiava a rainha viúva.
A regência de D. Pedro (1439-48) tem sido objecto de discussão e de interpretações contraditórias pelos historiadores: ora é vista, maioritariamente, como um período de centralização do poder real, ora, minoritariamente, como um período de afirmação senhorial.

Sem exageros extremados, deve considerar-se que D. Pedro esteve simplesmente entre dois tempos, o da nobreza tradicional e o da emergente burguesia urbana; que tinha consciência da precariedade da sua situação e que procurou manter o equilíbrio possível entre os interesses opostos dos diversos grupos sociais. Globalmente a sua regência pode ser caracterizada pelos seguintes aspectos:
  • Inicialmente, grande atenção à defesa militar do reino, para resistência a possível tentativa de invasão por parte de reino de Castela em apoio a D. Leonor. Defesa militar acompanhada de actuação diplomática no mesmo sentido;
  • Dotação do país com um ordenamento jurídico-administrativo coerente, o que foi concretizado com a finalização e publicação das Ordenações Afonsinas, em 1446, o primeiro código sistemático das leis nacionais;
  • Política de satisfação dos interesses/direitos das classes populares dos concelhos, garantindo a sua independência e liberdade frente à nobreza e abolindo ou limitando o direito de aposentadoria, contrabalançada com algumas concessões pontuais à grande nobreza senhorial para tentar neutralizar a sua oposição;
  • Reforma da Universidade, que dotou com receitas próprias, com o objectivo da formação apropriada do clero e da magistratura, os quadros dirigentes da vida pública do país; inclusivamente, criou em Coimbra uns Estudos Gerais, paralelos aos de Lisboa, projecto gorado após a sua morte;
  • Alteração da política expansionista, orientando-a deliberadamente para a descoberta da costa africana e sua exploração comercial e para a colonização das ilhas atlânticas, em detrimento das conquistas africanas.
Este novo rumo da expansão concretizou-se nomeadamente na exploração de cerca de 198 léguas da costa africana, desde o Rio do Ouro até à Guiné; na concessão ao Infante D. Henrique de direitos monopolistas sobre a navegação e comércio das terras africanas a sul do Cabo Bojador; no desenvolvimento das relações comerciais com a costa africana, fonte de mão-de-obra escrava e de ouro; na construção da feitoria de Arguim e no incentivo à participação de particulares nas actividades expansionistas.
O próprio D. Pedro participou directamente nas descobertas armando navios seus para o efeito e tomando a seu cargo a colonização da maior ilha dos Açores, a de São Miguel (4)». In José Ermitão Wikipédia.

Continua
Cortesia de Wikipedia/JDACT