quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Mia Couto. Poesia. Raiz de Orvalho. «No mundo que combato morro, no mundo por que luto nasço»

Cortesia de opatiobarfaro

Identidade
Preciso ser um outro
para ser eu mesmo.

Sou grão de rocha.
Sou o vento que a desgasta.

Sou pólen sem insecto.

Sou areia sustentando
o sexo das árvares.

Existo onde me desconheço
aguardando pelo meu passado
ansiando a esperança do futuro.

No mundo que combato
morro,
no mundo por que luto
nasço.
(1977)

Primeira Palavra
Aproxima o teu coração
e inclina o teu sangue
para que eu recolha
os teus inacessíveis frutos
para que prove da tua água
e repouse na tua fronte.
Debruça o teu rosto
sobre a terra sem vestígio
prepara o teu ventre
para a anunciada visita
até que nos lábios humedeça
a primeira palavra do teu corpo.
(1980)
Poemas de Mia Couto, in «Raiz de Orvalho»

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