sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Leituras. Parte XIV. Sanjay Subrahmanyam: O império Asiático Português, 1500-1700. «Não estaremos certamente muito longe da verdade se calcularmos a população da Ásia em 1500 entre 200 e 225 milhões, o que significa que os Portugueses «assistiram» ao longo dos primeiros dois séculos da sua presença na Ásia a qualquer coisa como a duplicação da população do continente»

Cortesia de difel

A Ásia nos Princípios da Idade Moderna. Transformações Geopolíticas e Económicas
«O mundo entre o Cabo da Boa Esperança e o Japão, onde os Portugueses tentaram construir uma rede de comércio e de poder entre 1500 e 1700, não era um mundo estático. Era caracterizado pela transformação, por vezes quase imperceptível, por vezes bem visível, em ambos os casos ao nível institucional e funcional. Para entender as acções portuguesas na Ásia, portanto e para compreender as acomodações que tiveram de fazer, assim como as rotas que usaram, é preciso ir mais longe do que descrever o «palco asiático» no qual foram actores. Pelo contrário é necessário considerar o problema das dinâmicas da história asiática ao longo desses duzentos anos.
A população da Ásia, cerca de 1650, rondava os 300 milhões de uma população mundial de talvez 500 milhões. Cem anos mais tarde, em 1750, o continente ainda contribuía com sessenta por cento da população mundial, que já havia então subido para cerca de 700 milhões. Ao longo do século e meio anterior a 1650, quando as estimativas são muito difíceis de obter, é provável que já tivesse ocorrido um grau razoável de expansão numérica após os meados do século XV, por toda a Eurásia, a recuperação da peste negra toma definitivamente a forma de uma expansão, demográfica. Não estaremos certamente muito longe da verdade se calcularmos a população da Ásia em 1500 entre 200 e 225 milhões, o que significa que os Portugueses «assistiram» ao longo dos primeiros dois séculos da sua presença na Ásia a qualquer coisa como a duplicação da população do continente.

Cortesia de slide

A população estava, não é necessário dizer, distribuída de modo desigual. Parece certo que a Ásia tropical e subtropical detinha uma quota-parte bem maior da população total do que as regiões mais a Norte, mas esta diferença não era tão marcada no fim do nosso período como o havia sido no seu início.
No limite do espaço a que nos referimos ficava o Japão, acerca do qual os historiadores modernos são unânimes em afirmar que o período entre 1500 e 1700 assistiu a ritmo de crescimento populacional bem maior do que o verificado nos séculos XIV ao XVIII, respectivamente o período antecedente e o seguinte.
De facto, se aceitarmos as estimativas de autores como Akira Hayami, podemos concluir que as taxas de crescimento da população do Japão dos princípios da Idade Moderna (cuja amplitude varia entre 0,8 e 1,3% ao ano) estavam entre as mais altas da Ásia. Em nítido contraste está a Ásia do Sueste, cujos historiadores apontam um crescimento demográfico lento para o período entre 1600 e 1800; embora esta periodização não nos permita falar directamente do século XVI, a impressão que fica é a de que as taxas de alteração demográfica naquela região (cuja população poderá ter totalizado uns 22 milhões em 1600) raramente terá excedido 0,2% ao ano em todo o período entre 1500 e 1800.
Encravadas entre o Japão e a Ásia do Sueste, os dois extremos da história demográfica asiática dos princípios da Idade Moderna, ficam outras regiões, algumas mais próximas do Japão, outras mais aproximadas do caso da Ásia do Sueste.

Ásia e Oceania, c. 1550

Peregrinação de Fernão Mendes Pinto
Cortesia de wikipedia

No primeiro caso está a China, cuja população cresceu de cerca de 60 milhões em 1400 para 180 milhões em 1750, mesmo se uma aceleração significativa a este crescimento ocorreu apenas após 1680 (quando a população chinesa se estimara em apenas 120 milhões. Na última categoria, temos que incluir grande parte do Sul e do Oeste Asiático onde se tem que trabalhar sobre dados maioritariamente qualitativos, já que as estatísticas de população são na sua maior parte duvidosas até ao século XVIII. Juntando as diversas informações, é possível concluir que o equilíbrio da população asiática tendeu gradualmente do Sul e Oeste para Norte e para Leste, ao longo do período em causa.
Não só a população total cresceu e o seu equilíbrio se alterou, como este período assistiu também à consolidação de alguns grandes centros urbanos e ao declínio de outros. Cidades como Delhi, Agra, Achém, Quioto, Isfahan e Istambul (estando esta última de algum modo entre a Europa e a Ásia), eram comparáveis em ordem de magnitude e complexidade da respectiva estrutura social com qualquer das cidades europeias dos séculos XVI e XVII. Nem foi esta transformação um fenómeno puramente urbano: em parte pela pressão populacional, em parte por outras razões, a área de terra cultivada alargou-se, tal qual a produção de manufacturas, com a Índia e a China detendo possivelmente no século XVII mais de metade da produção têxtil mundial. Para reiterar o nosso ponto inicial, mesmo os índices mais evidentes não sustentam a ideia de uma Ásia estática, levada ao confronto com um Portugal dinâmico e em expansão». In Sanjay Subrahmanyam, O Império Asiático Português, 1500-1700, Uma História Política e Económica, Difel, Memória e Sociedade, 1995, Fundação Oriente, ISBN 972-29-0328-4.

Cortesia da Difel/JDACT