segunda-feira, 18 de abril de 2011

Jaime Cortesão. Política, História e Cidadania: Parte IV. «A sua peça, O Infante D. Henrique, respondia assim às inquietações do momento, transportando o entusiasmo heróico e epopeico para o público leitor e sobretudo para a plateia que assistiu aos seus dramas»

Cortesia de wikipedia

«Nos seus primeiros dramas, recuperando o gosto romântico pelo drama/ficção histórica, são escolhidos para protagonistas da acção figuras que encarnam virtudes heróicas em momentos decisivos da história nacional. Homens que pelas suas qualidades e virtudes, pelo seu heroísmo, são modelos a apresentar aos cidadãos, como guias da «transformação social». Uma vinculação à teoria de heroísmo romântico de Carlyle, que mais tarde confirmará. Procura Cortesão «génios da acção, aureolados por uma lenda de heroísmo ou santidade», que exprimissem de modo singularmente dramático a nostalgia de um destino heróico. Projectados no palco estes heróis eleitos adquirem vida e movimento dramático, ainda que por vezes efabulado, de forma a causar emoção e empatia num público vasto.
Cortesão esperava que este público fosse além do pequeno número de pessoas que então versava os estudos históricos. Um propósito claro de educação popular, apelando ao heroísmo, à imaginação e à memória colectiva, procurando também corresponder aos anseios e horizontes de expectativa do público. A par deste objectivo e complementando-o surge o recurso ao drama como forma de difusão e divulgação da História de Portugal, tendo como suporte o «individualismo romântico e a sua concepção heróica da história». Uma intenção pedagógica de divulgação cultural que recebe influências de autores oitocentistas. como Oliveira Martins.

jdact
Na generalidade, os dramas históricos não possuem a preocupação com a verdade histórica, à maneira positivista, não é no entanto de excluir a existência de uma intencionalidade «de verosimilhança e credibilidade histórica», aliada à expressão, imaginação literária e criatividade artística. A superioridade da intenção pragmática do drama em relação à «verdade histórica», documental e crítica, é confirmada pelo  autor:
  • «o que nos interessa, (...) não é a exacção histórica dos factos, aliás impossível de realizar, mas a pura representação dos sentimentos que os influíram».
O recurso à ficção não é incompatível e não elimina alguma preocupação com a veracidade histórica na caracterização das personagens e dos ambientes em que estas se movimentavam.
Definindo as bases para perceber as várias tendências que se expressam na literatura histórica ou de fundo histórico, Luís Reis Torgal identifica em Jaime Cortesão, e também em Raul Brandão, a procura de um
sentido de reconstrução nacional e também uma «concepção originária e idealista de República», que se revela na forma como a literafura se entranha na história, reflectindo muitas vezes as amarguras e anseios do presenter. O primeiro dos aspectos é referido por Cortesão quando esclarece que as suas intenções ao escrever um drama épico seriam as de divulgar «a participação heróica do povo português no maior esforço cìvìlizador do seu tempo».

Cortesia de purl
Por outro lado, estas reflexões e a escrita do primeiro drama enquadram-se no período em que Portugal discutia a sua intervenção no grande conflito mundial e daí acresce também a necessidade de buscar no passado exemplos que revigorassem os ânimos e as vontades para o dever ético e moral da participação da Pátria nesse drama da Humanidade. A sua peça, O Infante D. Henrique,  respondia assim às inquietações do momento, transportando o entusiasmo heróico e epopeico para o público leitor e sobretudo para a plateia que assistiu aos seus dramas. Jaime Cortesão participou activamente na propaganda intervencionista, quer no Parlamento, quer na direcção do diário portuense O Norte.No prólogo escrito no Porto, quando Portugal já tinha efectivado a sua participação na I Guerra, o apelo reveste-se de palavras de esperança e entusiasmo para os que partiram e para os que, sofrendo, ficaram:
«E já que hoje, como dantes
No tempo dos Navegantes,
Os heróis da tua terra
Vão às paragens distantes
Ganhar a honra na guerra
 (...)
Eis que brilha num clarão
A velha espada da Raça
De novo na sua mão».

Cortesia de becrevidago
Indagamos agora a simbologia que julgamos existir na escolha dos períodos da história de Portugal em que decorrem as acções dos dois dramas históricos. Ambos os heróis, o Infante e Egas Moniz, movem-se em contextos sociais e culturais, em épocas históricas, que se coadunam com a sua elevação e heroísmo épico:
  • a expansão marítima e a fundação da nacionalidade.
Dois períodos privilegiados por Cortesão, fundamentalmente o primeiro, na sua obra histórica. A eleição destes momentos da história nacional continha, no caso do drama, uma função explícita:
  • inspirados no passado e nos ideais de heroísmo nele existentes, procurava-se a unidade e a regeneração da Pátria.
A emoção, o messianismo, a vibração heróica aliados à construção simbólica e ao culto da Pátria presentes nos versos que se seguem revelam o sentido da obra:

«Ó guerreiros, navegantes,
E vós, ó altos infantes,
Acordai, voltai à vida;
Sede a Pátria ressurgida».

In Elisa Neves Travessa, Jaime Cortesão, ASA Editores, 1ª edição, Setembro de 2004, ISBN 972-41-4002-4, obra adquirida e autografada em Fevereiro de 2006.

A amizade de ENT.
Cortesia de Edições ASA/JDACT