segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

O Tratado de Confissom: Um dos primeiros livros impressos em língua portuguesa. O Tratado de Confissom é uma obra de cariz pastoral. Desconhece-se o autor, sendo descoberto em 1965 pelo investigador Pina Martins


Cortesia de livrariabizantina

O Tratado de Confissom é um dos primeiros livros impressos em língua portuguesa.
A sua importância reside no facto de ter sido considerado algum tempo «o primeiro livro impresso em língua portuguesa» conhecido. Contudo, o Sacramental parece ter sido impresso ainda antes, em 1488.
Foi impresso em 1489 em Chaves, provavelmente por impressores castelhanos. A obra é um pequeno tratado sobre a confissão, para instrução do clero com cura de almas acerca da melhor forma de administrar o sacramento da penitência. Desconhece-se o seu autor. Pelos castelhanismos existentes no texto, é provável que a obra tenha sido traduzida de uma outra em castelhano. Até 1965, não há qualquer notícia da existência da obra. Nessa data, é descoberto um exemplar, o único encontrado até ao momento e que se encontra na Biblioteca Nacional. Pina Martins publicou em 1973 uma edição do texto com um estudo histórico-cultural e José Barbosa Machado publicou em 2003 uma nova edição acompanhada de um estudo linguístico.

Cortesia de paulowdesignerwordpress
Polémico e repressivo, é um retrato dos «comportamentos desviantes» dos cristãos do século XV, especialmente no âmbito sexual. Nele são tratados em pormenor o adultério, a violação ou estupro, a pedofilia, o incesto, o aborto e a homossexualidade. No estudo de José Barbosa Machado são referidos aspectos fonéticos, gráficos, morfossintácticos, lexicológicos e semânticos que permitem concluir, por um lado, que a redacção do texto da obra é bastante anterior à data da sua impressão, o que vem contrariar tudo o que foi dito até ao momento acerca da sua datação, e por outro, que a obra é uma tradução/adaptação de textos castelhanos com a mesma temática.

Tratado de Confissom
Do Prólogo
«Todo iuiz e prelado da sãcta igreia pera seer boo iuiz e manteer bem seu estado deue a seer dereyto e auer dereyta emtençom em todalas coussas que fezer e iulgar. E esto aparece per muitas razooës e semelhãças, ponhamos segumdo dize Aristotiles. Se algum da semtemça dereyta empero que nõ ha a emtëçom dereyta mais daa por medo ou peita ou por amor do outro, tal iuiz como este nõ he dereito iuiz, ainda que dee a sentença dereita, porque a nõ da com dereyta emtëçom. Veemos nos aynda nas cousas corporaaes que aquella cousa que dizemos dereita, que ha todallas partes iguaaes e non se inclina mais da hüa parte que da outra o quall iuiz deue asi seer dereito que em nenhüa maneyra nem por nenhüa rezom nõ se inclinar mais a hüa parte que a outra. E por eso diz Sãt Bernardo: Deus deu ao homem corpo e estatura dereyta pera lhe dar a entëder que deue a guardar e teer dereyto em todallas cousas e como quer que dito he, todo iuiz deue auer sempre em iulgamdo dereita emtemçom empero sem esta dicta emtemçom deue a confirmar com aquellas cousas que ë dereyto sõ scriptas e ãte ell forë alegadas.

Chaves, século XVI
Cortesia de causamerita
Onde diz Santo Ãbrosio que o iuiz quando uyer ao iuizo nõ deue a iulgar següdo a cõciencia e uoontade que trouuer de sua casa mais següdo as razooës e os dereitos que forë em iuizo perante ell alegados. Onde se huü homë ante alguü iuiz he acusado de algüa cousa falsamëte, empero suficientemente lhe he prouado per falsas testimunhas en tal caso següdo os doutores dizë. O iuiz se pode achar alguü caso pera o liurar apoëdo algüa cousa cõtra as testemunhas para o seu testemunho nõ ualer podeo fazer. Se nõ se ëtender que he mais segura cousa pera o acusado, deueo a inuiar a outro iuiz mayor. Se sabe que per ell sera liure e se nõ peca se nõ da sëtença cõtra ell següdo as razooës que forem alegadas ante ell, como quer que o faça contra sua emtëçom e cõtra a uerdade que en outra maneira sabe nõ como iuiz. Ca tall nõ condepna ell, mais aquelles que cõtra ell derõ aquel falso testemunho. E se ë outra maneira o iuiz da sentëça cõtra conciëcia e contra dereito e em periuizo doutro por amor ou por peita, fica sospëso do oficio por huü ano e he theudo dentregar a outra parte quãto per sua sëtença perdeo e demais se he oficiall na igreia, he irregular e nõ pode seer absolto senom pollo papa de Roma següdo diz a degratal.

Chaves, século XVIII
Cortesia de causamerita
Següdo dizë os sãctos cada huü iuiz e moormente eclesiastico tã firme e tan estauell deue a seer ë iulgãdo dereito que nõ deue a leixar a iulgar todo aquello que dereito for por medo de pessoa que no mundo aia, në por periigoo que lhe ende posa uiir, nem por amor në por peita në por odio, que alguë aia ca estas quatro cousas sõ porque algüas uezes algüus iuyzes nom iulgã dereito cõuem a saber temor, cobiiça, et cetera, unde uersus quatuor ista timor, odium, dilectio sësus, sepe solët hominü peruertere sësus. Onde bë deue a parar mëtes todo iuiz e deue saber següdo diz um degredo que se algüa sëtëça da contra dereito por algüa destas cousas ou por outra quallqueer que ëtende, deue a ëtregar aquell comtra que deu a sentença todo aquello que per ella perdeu saluo se fezese aa outra parte que lho ëtregasse e demais segumdo as leis dos emperadores he theudo a outras muitas penas. E este tall por este pecado deue a receber mui grãde peemdemça». In Projecto Vercial.

http://cvc.instituto-camoes.pt/bdc/revistas/revistaicalp/idconfissom.pdf

Cortesia de Alfarrabio Di UMinho/Projecto Vercial/JDACT