quinta-feira, 10 de junho de 2010

Teófilo Braga: Segundo Presidente da República. O positivismo de Auguste Comte exerceu influência na sua forma de pensar, na sua obra literária e na sua atitude política

Cortesia de wikipedia

História da vida e da morte de um Cavaleiro Andante
«Edificada sobre uma religião de recordação, a Igreja medieval integra desde cedo nos seus rituais as orações pelos mortos, desenvolvendo-se em paralelo os chamados libri memoriales, listas nominais, organizadas em forma de calendário, que registam os óbitos dos benfeitores das igrejas, geralmente os seus próprios membros, personagens ilustres ou outros particulares, e as respectivas doações para por eles se celebrarem missas de aniversário (sobre a memória dos mortos, e a forma como era ritualizada durante a Idade Média; além dos necrológios, há um outro tipo de literatura conexa, os martirológios, que associam os mortos aos mártires fixados e celebrados pelo calendário litúrgico). A Sé de Lamego possui um desses livros, um Obituário composto no fim do século XIII por volta de 1293, onde fomos encontrar, naquele incógnito emaranhado de muitos nomes, a seguinte ocorrência: Obijt domnis domnus Jnfans fernandus de Serpa. E.ª M.ª CC.ª Lxxx.ª iiij.ª2. Trata-se do registo da morte do infante Fernando de Serpa, neutro e despojado de qualquer adjectivação que nos informe sobre a natureza do seu passamento, não mencionando sequer os supostos bens que seria normal deixar para aniversário. Dificilmente ultrapassaria o anonimato das palavras que aquele livro da morte encerra, não fosse a especificidade vocabular que o identifica e qualifica perante os demais: na qualidade de senhor, possuidor de potestas, territorializada no nome da sua terra; depois, na sua pertença à mais importante linhagem nobiliárquica, a da realeza. Ascendência régia evocada no título infans que antecede o seu nome, com o qual eram designados os filhos e filhas de reis, sobretudo a partir do início do século XIII.
A morte surpreendeu-o no dia 19 de Janeiro de 1246, a ter como certo o registo do referido Obituário. Nascido, com toda a probabilidade, em Santarém no mês de Março de 1218, cidade que o seu pai escolheu para estacionar durante todo o Inverno, de Dezembro de 1217 a Abril do ano seguinte (um documento datado de Março de 1218, passado em Santarém, ainda não inclui Fernando entre os filhos de Afonso II, enquanto que num outro do mesmo mês ele já aí consta como fazendo parte da sua filiação), teria 28 anos à data da sua morte. Filho do consórcio do rei Afonso II, neto de Afonso Henriques, e da rainha D. Urraca, filha de Afonso VIII de Castela, o que venceo a batalha das Naves de Tollosa, era o terceiro filho varão, irmão mais novo dos infantes Sancho, o herdeiro da coroa, e Afonso, aquele que irá ter grande protagonismo ocupando o trono na sequência da guerra civil de 1245-1248, e da infanta D. Leonor, efémera Rainha, a que casou em 1229 com o rei Waldemar III da Dinamarca.
Uma morte jovem, prematura até. Pelo menos assim o entendemos hoje; porém, a realidade daqueles tempos tão longínquos é outra, de mais difícil apreensão. Então, a esperança média de vida podia não ultrapassar os 32 anos, a chamada maioridade atingia-se bem mais cedo e o turbulento período da sua juvenilitas já tinha passado havia muito. O tempo apenas, porque as turbulências, essas permanecem como o traço mais marcante da sua personalidade, ou pelo menos o mais evidente. De qualquer modo, uma morte tão jovem não pode deixar de nos impressionar, sobretudo quando nos apercebemos da imensa vitalidade, o dito infante rufia, que demonstrou. Seriam estas as causas da sua morte? É possível que sim, que tenha tido uma morte violenta. Na verdade, o seu testamento, a ter existido, não se conhece, e quanto ao paradeiro do seu túmulo nada se sabe, apesar de se levantar a hipótese de a sua sepultura se encontrar na igreja catedral de Burgos, da qual sua mulher foi generosa benfeitora e com a qual transacionou algumas propriedades. Ou talvez em Lamego, que o regista no seu livro de óbitos (para reforçar a hipótese de Lamego, devemos acrescentar que Fernando de Serpa manifestou um grande interesse por esta região na última fase do seu percurso político; seria, portanto, muito natural, que tivesse tomado algumas diligências para aí ficar sepultado aquando da sua morte)». In Armando Sousa Pereira, O Infante Fernando de Portugal, Senhor de Serpa (1218-1246), História da vida e da morte de um Cavaleiro Andante, Estudo apresentado em Setembro de 1997, Seminário “A nobreza medieval portuguesa: parentesco, identidade e poder”, dirigido por Bernardo Vasconcelos Sousa, revista Lusitânia Sacha, 2ª série, 10, 1998.

Cortesia de LSacha/JDACT